Blaise Pascal (filme) – Wikipédia, a enciclopédia livre

Blaise Pascal
Blaise Pascal

Capa do DVD lançado pela Versátil Home Video
Itália/França
1972 •  cor •  135 min 
Gênero cinebiografia
Direção Roberto Rossellini
Produção Roberto Rossellini
Renzo Rossellini
Roteiro Marcela Mariani
Roberto Rossellini
Renzo Rossellini
Luciano Schaffa
Jean-Dominique de La Rochefoucauld
Elenco Pierre Arditi
Rita Forzano
Giuseppe Addobbati
Christian De Sica
Livio Galassi
Bruno Cattaneo
Música Mario Nascimbene
Diretor de fotografia Mario Fioretti
Figurino Marcella de Marchis
Companhia(s) produtora(s) Orizzonte 2000
RAI
ORTF
Distribuição Radiotelevisione Italiana
Lançamento 16 de maio de 1972
Itália
Idioma italiano/francês

Blaise Pascal[1][2] é um telefilme franco-italiano dramático biográfico de 1972 dirigido por Roberto Rossellini, em uma coprodução RAI-ORTF.[3] Acompanha a trajetória do matemático, filósofo, teólogo, inventor e físico Blaise Pascal, dos seus 17 anos até sua morte, demonstrando a formação de seu pensamento científico e teológico, suas invenções e formulações, e sua relação com o jansenismo. Faz parte de um série de telefilmes histórico-didáticos realizados pelo diretor e é o segundo a tratar de um filósofo; precedido apenas por Sócrates, transmitido em 1971.[4]

É um longa-metragem biográfico parte da tetralogia sobre filósofos, “Os Filósofos” que incluem as cine-biografias de: Sócrate, Agostinho e Descartes.[5]

Sinopse[editar | editar código-fonte]

Nesta obra menos conhecida de Rossellini, organizada de forma episódica, acompanhamos a trajetória de Blaise Pascal, dos 17 anos até sua morte precoce, mostrando seus célebres estudos de Matemática e Geometria, incluindo a criação da primeira calculadora mecânica; seus trabalhos revolucionários sobre o vácuo, os fluidos e a pressão atmosférica; sua relação com o Jansenismo e a concepção de suas principais obras filosófico-religiosas, envolvendo, frequentemente, diálogos com inúmeros pensadores.

Enredo[editar | editar código-fonte]

O jovem Blaise Pascal, nascido na França em 1623, é um estudioso muito habilidoso e inteligente que vive do estudo dos princípios da matemática e da mecânica já introduzidos por René Descartes, o inventor do plano cartesiano e superior. Pascal publica como seu primeiro trabalho um ensaio sobre geometria e matemática, no qual explica as cônicas que formariam uma estrela não de cinco, mas de seis pontas. No entanto, Pascal não é totalmente compreendido por seus pares, devido ao seu gênio precoce.

Com a saúde muito debilitada, Pascal passa a maior parte dos dias na cama com febre, quando se depara com um grupo de pensadores de uma nova filosofia que ajudaria seu pai após uma brusca queda: o Jansenismo, nascido de Jansênio. Blaise Pascal fica impressionado com as teorias jansenistas ao saber que eles se declaram membros de um círculo fechado ordenado por Deus que teria a tarefa de espalhar o conhecimento para o mundo, enquanto, até então, via a Igreja apenas um conforto que explorava os mais pobres e ignorantes.

Até aquele momento, Pascal havia concebido Deus como algo impalpável e superior que teria gerado o mundo, os planetas e tudo o que o homem conhece graças, também, às recentes descobertas científicas. Depois de dois anos, em 1653, Pascal teve uma visão durante uma noite em que Deus aparecia a ele e lhe dizia para divulgar suas leis e regras escritas na Bíblia. Pascal, então, analisa os princípios e principais sermões de João Batista e Isaías que anunciam a chegada de Jesus e ameaçam o Castigo Eterno para aqueles que não respeitam as leis de Deus.

Partindo da ideia de difundir o jansenismo, Pascal aproveita para refletir também sobre a alma humana e sobre a complexidade das ideias de cada um, concluindo que Descartes havia usado Deus apenas para dar origem aos seus princípios a serem tratados na mecânica. Segundo Pascal, a alma humana, junto com o seu pensamento, está sempre perturbada e dividida nos caminhos certos a seguir para chegar à Verdade. O espírito é sempre caracterizado por uma busca interior e, sobretudo, dividido pela filosofia. Pascal afirma em sua mais recente e importante obra que esse pensamento pode ser concebido tanto do ponto de vista católico quanto do científico para a busca de descobertas. Pascal morre aos 39 anos, dez anos depois de sua "conversão".

Elenco[editar | editar código-fonte]

Produção e distribuição[editar | editar código-fonte]

Antecedentes[editar | editar código-fonte]

Rossellini, especialmente a partir dos anos 1960, vinha se sentindo insatisfeito com o cinema, a arte e o mundo contemporâneo e via na televisão uma ferramenta para espalhar educação para milhões de pessoas; ajudando a criar, assim, uma sociedade mais "iluminada".[7] Para que o diretor alcançasse seu objetivo, em sua opinião, seria necessário realizar obras televisivas que rompessem com as tradições cinematográficas até então estabelecidas e criar uma linguagem simples e didática, própria para o então novo meio.[8] Além disso, via o retrato de figuras e momentos históricos, especialmente relacionados ao desenvolvimento da ciência e da filosofia, como a "cura" dos males que afligiam o homem moderno.[9] A produção e distribuição dos filmes contou, em sua maioria, com as emissoras ORTF e, principalmente, RAI, as quais, devido ao seu monopólio na televisão francesa e italiana, respectivamente, e seu caráter estatal, possibilitavam que sua programação fosse voltada essencialmente à educação e cultura.[10] Por conseguinte, ao longo de um pouco mais de dez anos, Rossellini realizou 8 filmes e 4 seriados histórico-pedagógicos transmitidos pela televisão italiana e, também pela televisão francesa.[4]

Estilo[editar | editar código-fonte]

A ênfase de Rossellini em abordar a história era a de mostrar a evolução do pensamento e das ideias.[11] Ele queria apresentar a história de indivíduos que realizaram gestos de liberdade e que foram contra estruturas rígidas do pensamento de suas épocas.[12] Não queria focar no grandiosismo de figuras históricas, mas, sim, em sua fragilidades — os "heróis" são representados como pessoas comuns e há sempre a ênfase no cotidiano, nas pequenas ações.[13] Almejava, também, evitar um olhar ideológico frente ao passado e, para tal, preferia tratar da história distante, uma história fria.[13]

Ênfase no cotidiano e na evolução da ciência: a perna de Étienne Pascal é tratada com ervas mastigadas.

Inspirado pela pedagogia do pensador checo Comenius, que dava espaço especial à imagem no processo educativo, Rossellini formulou seus objetivos e mecanismos didáticos de seus filmes históricos. Pretendia aliar o olhar livre dos vícios da linguagem cinematográfica, de um público ainda não familiarizado com a programação televisa nascente, a uma "imagem essencial". Uma imagem que deveria ser simples na sua composição, porém rica e complexa nas suas informações, contendo inúmeras mensagens que agiriam no interior de cada um. Não queria apenas relatar o passado e descrever seus pensamentos, queria filmar diretamente uma ideia.[14]

Como Rossellini tentava traduzir suas utopias de forma pragmática à tela, sempre partindo da economia de recursos, algumas escolhas foram tomadas: uso da lente Pancinor,[15] lente zoom desenvolvida pelo próprio Rossellini; do plano-sequência,[10] contendo, em um único take, inúmeras mensagens e informações; enquadramento frontal, na altura dos olhos, que mostra o corpo inteiro; simplicidade da forma narrativa,[16] episódica e linear, retirando tensão e o suspense, evitando a espetacularização e dando ênfase às pequenas ações; dublagem e o uso de atores amadores ou não-atores, evitando os vícios da dramatização excessiva que um ator profissional normalmente carrega consigo.[16]

Recepção[editar | editar código-fonte]

Público[editar | editar código-fonte]

Blaise Pascal obteve cerca de 16 milhões de espectadores em sua transmissão pela RAI e, após a exibição, a emissora realizou uma enquete com o público perguntando sua opinião sobre o filme. Pouco mais de 59% afirmaram que gostaram do que assistiram, porém, antes da transmissão, apenas 1% dizia saber quem era Blaise Pascal, enquanto que, depois da transmissão, o número subiu para 45%. As vendas de livros sobre o filósofo também cresceram.[17]

Crítica[editar | editar código-fonte]

Os filmes históricos de Rossellini são, ainda hoje, pouco discutidos. Dentre suas principais razões, destacam-se a dificuldade de acesso às cópias, o preconceito que muitos críticos ainda possuem em relação à produções televisivas e à desconexão da crítica cinematográfica com o trabalho de Rossellini para a televisão.[18] No entanto, o restauro e relançamento dessa parte da obra [19] e a realização de mostras desses filmes[20] permitem novos olhares e reavaliações desse período da carreira do diretor italiano.

Referências

  1. Distribuidora Versátil Home Video (Brasil)
  2. Cinecartaz (Portugal)
  3. CRUCHINHO, Fausto (2007). «A televisão de Roberto Rossellini». Revista Estudos do Século XX (07). doi:10.14195/1647-8622_7_18 
  4. a b Filmografia de Roberto Rossellini (em inglês). IMDb
  5. «DVDs/Crítica: Em cinebiografia de Descartes, Rossellini fala para iniciados -». Jornal Folha de São Paulo. 24 de maio de 2009. Consultado em 17 de fevereiro de 2023 
  6. a b c d e f g h i j k l m n o p q r s Elenco de Blaise Pascal (em inglês). IMDb. Consultado em 17 de julho de 2021.
  7. ROSSELLINI, Roberto (1975). Utopia Autopsia . Barcelona: Dopesa. ISBN 84-7235-217-X 
  8. CRAMER, Michael (2017). Utopian Television: Rossellini, Watkins, and Godard beyond Cinema. Minneapolis: University of Minnesota Press. p. 8. ISBN 978-1-5179-0038-0 
  9. APRÀ, Adriano (2007). Roberto Rossellini e o cinema revelador. Lisboa: Cinemateca Portuguesa. p. 428 e 429 
  10. a b APRÀ, Adriano (2005). La télévision comme utopie. Paris: Cahiers du Cinema. p. 103 
  11. 8 GALLAGHER, Tag; HUGHES, John (abril de 1974). «Where are we going?». Changes (87). 243 páginas 
  12. ROSSELLINI, Roberto (2 de julho de 1977). «I believe in this». The New Republic. Nova York 
  13. a b COLLET, Jean; PHILLIPE, Claude-Jean (outubro de 1966). «Roberto Rossellini: La prise du pouvoir par Louis XIV». Cahiers du Cinèma (183). pp. 16–19 
  14. ROSSELINI, ROBERTO (2001). Un espíritu libre no debe aprender como esclavo. Barcelona: Ediciones Paidós Ibérica. ISBN 978-8425209383 
  15. KINGSLAKE, Rudolf (1989). A history of the photographic lens. San Diego: Academic Press Inc. p. 156-157. ISBN 978-0124086401 
  16. a b APRÀ, Adriano (2005). My Method: Writings and Interviews. New York: Marsilio Publishers. p. 167. ISBN 978-0941419642 
  17. GALLAGHER, Tag (1998). The Adventures of Roberto Rossellini: His life and films. New York: Dacapo Press. ISBN 978-0306808739 
  18. APRÀ, Adriano (2007). Roberto Rossellini e o cinema revelador. Lisboa: Cinemateca Portuguesa. p. 427 
  19. Rossellini’s History Films—Renaissance and Enlightenment
  20. Retrospectiva integral dos filmes de Rossellini na Cinemateca Portuguesa