Sobre a Verdade e Mentiras em um Sentido Não-Moral – Wikipédia, a enciclopédia livre

Friedrich Nietzsche em 1872.
Friedrich Nietzsche em 1872, no ano em que escreveu O Nascimento da Tragédia, um ano antes de ditar Sobre a Verdade e Mentiras em um Sentido Não-Moral à Carl von Gersdorff.

Sobre a Verdade e Mentiras em um Sentido Não-Moral (em alemão: Über Wahrheit und Lüge im aussermoralischen Sinne, também chamado de Verdade e Mentira em um Sentido Extra-Moral)[1] é um ensaio filosófico por Friedrich Nietzsche. Foi escrito em 1873, um ano depois de O Nascimento da Tragédia no Espírito da Música,[2] mas foi publicado por sua irmã Elisabeth em 1896, quando Nietzsche já estava mentalmente doente. O trabalho lida amplamente com questões epistemológicas sobre a natureza da verdade, linguagem e ciência, e como elas se relacionam com a formação de conceitos e, evidentemente, da moral.

Resumo[editar | editar código-fonte]

O ensaio de Nietzsche é separado em duas partes. A primeira trata da concepção e uso da linguagem, a segunda segue o mesmo tema, mas dessa vez tomando a ciência como a herdeira da linguagem no que concerne a fabricação e articulação de conceitos, agora com maior complexidade. O texto, portanto, fornece uma explicação (logo, uma crítica) das considerações contemporâneas de Verdade e conceitos.

Essas considerações, argumenta Nietzsche, surgiram a partir do próprio estabelecimento da linguagem:

De acordo com Paul F. Glenn, Nietzsche está argumentando que "conceitos são metáforas que não correspondem à realidade."[4] Embora todos os conceitos sejam metáforas inventados por seres humanos (criados de comum acordo para facilitar a comodidade da comunicação), escreve Nietzsche, os seres humanos esquecem esses fatos depois de inventá-los e passam a acreditar que são "verdadeiros" e correspondem à realidade.[4] Assim, Nietzsche argumenta que "verdade" é, na verdade:

Durante a segunda parte do ensaio, Nietzsche argumenta que a ciência parte de onde a linguagem parou, relativamente ao tecer de conceitos.[6] Esse seria um processo necessário para que o ser humano consiga sobreviver, afinal, o conhecimento é a sua maior ferramenta.[7] Contudo, elogia a cultura grega por lidar com a natureza de forma mais metafórica. O espírito artístico grego foi possível, de acordo com Nietzsche, porque o "homem intuitivo" possuía maior apreço social em relação à sua contrapartida, o "homem da razão".[7] Vale lembrar que este ensaio foi ditado por Nietzsche ao seu amigo Carl von Gersdorff um ano após a publicação de O Nascimento da Tragédia, livro em que Nietzsche similarmente elogia a cultura trágica grega. Assim, vivendo com menor compromisso à Verdade da razão, o "homem intuitivo" era mais artisticamente rico, portanto, e nessa mesma medida, possuía maior liberdade. Mas essa liberdade não é de todo lucro, pois o "homem intuitivo", quando sofre, sofre com maior intensidade, por não ter aprendido com a experiência, ao passo que o "homem da razão" estoicamente averte-se aos infortúnios da vida, ou, se inevitáveis:

Nesse sentido, o plano moral da verdade é o herdado historicamente, marcado pelo esquecimento das origens metafóricas da linguagem. Por isso, no campo moral, presume-se que a verdade é definitiva e inabalável, e que os conceitos são absolutamente precisos, em contraposição às metáforas, incertas e relativas. Já o extramoral é a renovada consciência dessas origens estritamente relacionais da linguagem, ou seja, sua natureza descompromissada desde sua incepção: a consciência de que toda a linguagem teve origem metafórica.[5] O segundo plano é extramoral por quebrar com o idealismo, visto que uma característica amplamente conhecida deste é a ancoragem moral da verdade. Como aponta Sobrinho, Nietzsche parece escrever este ensaio como censura à Crítica da Razão Pura, de Immanuel Kant, filósofo que fez parte do movimento idealista alemão.[6][7]

Essas ideias sobre a verdade e sua relação com a linguagem humana têm sido particularmente influentes entre os teóricos pós-modernos,[4] e "Sobre a Verdade e Mentiras em um Sentido Não-Moral" é uma das obras mais responsáveis pela reputação de Nietzsche (embora contenciosa) de "o padrinho do pós-modernismo."[8]

Ver também[editar | editar código-fonte]

Referências

  1. Walter Kaufmann's translation, appearing in The Portable Nietzsche, 1976 edition.
  2. Portable Nietzsche 42.
  3. Portable Nietzsche 46.
  4. a b c «The Politics of Truth: Power in Nietzsche's Epistemology». Political Research Quarterly. 57. doi:10.2307/3219819 
  5. a b Portable Nietzsche 46-47.
  6. a b Nietzsche, Friedrich Wilhelm; Barros, Fernando de Moraes (2007). Sobre verdade e mentira no sentido extra-moral. [S.l.]: Hedra. ISBN 9788577150748 
  7. a b c d Nietzsche, Friedrich (julho–dezembro de 2001). «Verdade e Mentira no Sentido Extramoral» (PDF). Rio de Janeiro. Revista Comum. 6 (17): 05-23. Consultado em 1 de julho de 2019 
  8. Cahoone, Lawrence E. (2003). From modernism to postmodernism: an anthology. [S.l.: s.n.] 

Leitura adicional[editar | editar código-fonte]

Ligações externas[editar | editar código-fonte]