Tremembés – Wikipédia, a enciclopédia livre

Tremembés
Pormenor do mapa da costa do Ceará de 1629 (Albernaz I); em destaque, as terras dos tremembés.
População total

aprox. 20 000 (período colonial)[1]
3 662 (Siasi/Sesai, 2014)[2]

Regiões com população significativa
 Ceará 3662 (Siasi/Sesai, 2014) [2]
 Maranhão
Pará Pará
 Piauí
 Tocantins
 Minas Gerais
Línguas
Língua portuguesa
Língua tremembé
Língua goitacá[3]
Língua geral poromongûetá[4][5][6]
Religiões
[7][2]
Etnia
Nordéstidos[8]
Grupos étnicos relacionados
Goitacás
Cataguás
Araios
Maués
Muras
Puris

Os tremembés são um povo étnico indígena que habita atualmente a área indígena Tremembé de Almofala (Itarema) e as terras indígenas São José e Buriti (Itapipoca), Córrego do João Pereira (Itarema e Acaraú) e Tremembé de Queimadas (Acaraú), no litoral do estado do Ceará, no Brasil. Também estão presentes em cidades do Maranhão como, Araioses e Tutóia, após migrações de terras cearenses.[9] O principal objetivo dos Tremembé é a demarcação de terras. São um povo que dá muita importância aos costumes, cultura e história para as próximas gerações.[10] A organização da tribo é separada entre os agentes de aldeamento. Ei-los: os diretores e cuidadores de índios, juízes de orfãos, religiosos, ligados à igreja, e por fim, membros da irmandade da Nossa Senhora da Conceição.[11]

Etimologia[editar | editar código-fonte]

O vocábulo é oriundo da expressão Tupi "tere-membé" que pode significar "tumultuario, amotinado"[12] ou "encharcado, alagadiço"[13] em alusão aos lugares onde o povo tremembé costumava habitar que geralmente eram compostos por brejos e pantanais na beira-mar. Muitos especialistas defendem tratar-se duma exodenominação dada pelos Tupis, a maneira como os Tupis os viam "peixes racionais" ou "moradores d'água". [14]

Descrição[editar | editar código-fonte]

Descrições dadas por Vicente Pinzón e sua tripulação ao se depararem com os tremembés na costa cearense.

Na sua visita as costas cearenses Pinzón não conseguiu contacto directo com os nativos do cabo de Santa Maria de la Consolación; notou porém que eles usavam bons arcos e lanças. Na sua segunda estação, em Rostro Hermoso, (Mucuripe) observou-os mais detidamente. Verificou que pernoitavam ao ar livre e acendiam fogos, dando a impressão que havia ali um acampamento. Percebeu também que "eram mais altos do que germanos ou húngaros". Informaram ainda os expedicionários, sob juramento, a Mártir que as pegadas dessa gente igualavam quase o dobro da do homem médio da Espanha.[15]

Descrições do Pe. Ivo d'Evreuz acerca da destreza dos tremembés no uso do arco e flecha e de sua força física colossal.

0 pe. lvo d'Evreuz diz que os Tremembés se alimentavam ordinariamente de peixes, porém, iam a caça; não gostavam de fazer hortas (agricultura) nem casas; moravam sob choupanas e preferiam as planicies às florestas. Com mais destreza que os Tupinambás pescavam à flecha. São tão robustos, acrescenta o padre, a ponto de segurarem pelo braço um dos seus inimigos (Tupinambá) e atirarem-no ao chão como se fosse um capão (galinha). Dormem ordinariamente na areia.[16]

Origem dos tremembés[editar | editar código-fonte]

Distribuição dos grupos indígenas no litoral do Brasil no século XVI
Etnias indígenas com mais representantes no Leste-Nordeste do Brasil
Mapa indicando a presença indígena contemporânea no Ceará. Fontes: Fundação Nacional do Índio e Fundação Nacional de Saúde.

Os tremembés eram originalmente nômades não tupis que viviam num território que se estendia do sul do Maranhão até ao Rio Acaraú, no atual estado do Ceará[17]. Exercem por dois séculos trocas comerciais com muitos europeus que atracavam na costa brasileira a fim de manter controle sob o seu território. No século XVIII foram aldeados pelos Jesuítas nas missões de Tutoya (Tutóia-Maranhão), Aldeia do Cajueiro (Almofala) e Soure (Caucaia).[18][19] Nos tempos coloniais, os Tremembé viviam na região desde a foz do rio Gurupi, no Maranhão, até a Serra de Ibiapaba, no Ceará. Viviam principalmente da pesca e do comércio de estrangeiros. Eram corajosos e resistentes aos ataques dos colonizadores.[10]

Foram declarados como não existentes pelo então governador da Província do Ceará (José Bento da Cunha Figueiredo Júnior), após decreto de 1863. Antes disto, em 1854, os índios perderam o direito da terra pela regulamentação da Lei da Terra. Esses ressurgem no cenário cearense nas décadas de 1980 e 1990, quando são reconhecidos pela Fundação Nacional do Índio.[20]

Nas décadas de 1950 e 1960, famílias tremembés emigraram aos municípios de Raposa, junto com migrações de pescadores cearenses para a região, e de São José de Ribamar, para trabalhar num dos engenhos da região.[21][9]

Em 2013, os tremembés de Raposa tiveram sua etnicidade reconhecida pela Funai, em processo que contou com a participação de alguns membros do povo tremembé, que continua a viver em Almofala, e lutam pelo acesso aos direitos específicos e políticas sociais.[22]

Os tremembés de São José de Ribamar lutam por reconhecimento étnico e pela posse das terras da comunidade de Engenho.[23][9]

Lideranças tremembés que ficaram na história[editar | editar código-fonte]

Cacique Tatuguaçu (Tatu Grande)[editar | editar código-fonte]

Principal tremembé, inimigo dos portugueses, certa feita tentou dizimar uma expedição portuguesa que depois de muito perigo logrou fugir durante a noite. (Século XVI).[24]

Tatupeba (Tatu chato)[editar | editar código-fonte]

Cacique de Camocim, Ceará.[24]

Arinhã Magú[editar | editar código-fonte]

Cacique do povo Araio no Maranhão (1679 - 12 de abril de 1763). [25]

Arte e cultura[editar | editar código-fonte]

Arte tremembé

O torém[editar | editar código-fonte]

Os tremembés conseguiram reaprender um pouco da sua arte e cultura. Dançam o torém (uma dança tradicional tremembé) e ainda produzem o mocororó (vinho de caju azedo fermentado).[26] Costumam pintar as paredes das suas habitações, das escolas diferenciadas e cerâmicas com motivos simbólicos do seu habitat, como: o caju, a rolinha, peixes, caranguejos e outros. As mulheres tremembés confeccionam biojoias, como colares e pulseiras com conchas, búzios e sementes e costumam vendê-las a 7 de Setembro, dia em que os tremembés empreendem a marcha tremembé desde 2003.[27] Realizam-se muitos eventos culturais ao longo do ano pela tribo Tremembé. Eis alguns exemplos: o Torém, uma manifestação cultural relacionada à natureza, e também outros eventos, como a Festa do Murici e Batiputá, Festa e Iemanjá, etc.[10] A tecelagem também é confeccionada por eles. Os Tremembé falam apenas o português brasileiro, mas guardam resquícios da língua nativa, conhecida como Poromonguetá, uma língua derivada da família de línguas Tupi. Os cânticos do Torém contém muitas palavras do Poromonguetá, misturadas à palavras de origem Tupi.[4]

Dança do caroço[editar | editar código-fonte]

Não há consenso quanto à origem da dança do caroço, há quem correlacione suas origens a antigos ritos de origem africana.[28] No entanto, muitos também afirmam que está diretamente ligada ao povo tremembé que habitava o município de Tutóia antes da chegada dos colonizadores na região.[29]

Exímios nadadores e pescadores[editar | editar código-fonte]

Os tremembés são descritos como hábeis nadadores e pescadores por cronistas do período colonial, conforme é relatado, arremetiam a nado contra os tubarões com uma madeira pontuda, enfiavam-na guela adentro da boca do animal e traziam-no a superfície não tanto com o propósito de comê-lo, mas para extrair-lhe os dentes e fazer as pontas de suas flechas que eram venenosas e mortíferas.[30]

Pré-Tremembés[editar | editar código-fonte]

O engenheiro, escritor e presidente do Instituto do Ceará Pompeu Sobrinho defendeu enquanto vivo que os tremembés habitaram alguns trechos das praias do Sul do Brasil, o que englobava um território que corresponde desde o atual estado do Rio Grande do Sul até o atual estado do Rio de Janeiro. No estado de São Paulo há uma praia cujo tupônimo é "Tremembé" em alusão a esse povo que outrora lá habitara. [31]

Notas

  1. Catolicismo sincrético, convivência de santos católicos com os espíritos de caboclos.

Referências

  1. «Tribos Indígenas Brasileiras». web.archive.org. 2 de janeiro de 2016. Consultado em 4 de fevereiro de 2023. Cópia arquivada em 2 de janeiro de 2016 
  2. a b c Povos indígenas no Brasil. Disponível em https://pib.socioambiental.org/pt/povo/tremembe. Acesso em 15 de março de 2017.
  3. Pinto, Estêvão. Os indígenas do nordeste. EDIÇÃO ILUSTRADA COM 45 DESENHOS E MAPAS. 1935. Campanha Editora Nacional. p. 144, 145.
  4. a b Tremembé, Mbo'esara (28 de dezembro de 2010). «Poromonguetá: a Língua dos Tremembé». xembae.blogspot. Consultado em 18 de novembro de 2022 
  5. «Poromongûetá love poem». love.poem.free.fr (em pr). Consultado em 12 de fevereiro de 2023 
  6. «Povo Tremembé do litoral cearense é celebrado em coleção de moda». AGÊNCIA ECONORDESTE. 12 de janeiro de 2022. Consultado em 12 de fevereiro de 2023 
  7. Project, Joshua. «Tremembe in Brazil». joshuaproject.net (em inglês). Consultado em 8 de agosto de 2022 
  8. Sobrinho, Pompeu. Pré-História Cearense. 1° tomo. Editora "Instituto do Ceará". 1955. p. 78, 79, 124.
  9. a b c Elizabeth Maria Beserra Coelho; Mônica Ribeiro Moraes de Almeida. «31ª REUNIÃO BRASILEIRA DE ANTROPOLOGIA GT 56. Povos indígenas, afrodescendentes e outros povos tradicionais, conflitos territoriais, e o não reconhecimento pelo Estado nacional.». DINAMICAS DAS LUTAS POR RECONHECIMENTO ÉTNICO NO MARANHÃO 
  10. a b c Cabral, Ana (2014). História dos Tremembé: memórias dos próprios índios (PDF). [S.l.: s.n.] 
  11. «Tremembé - Povos Indígenas no Brasil». Tremembé - Povos Indígenas no Brasil. 25 de janeiro de 2021. Consultado em 18 de novembro de 2022 
  12. B. Caetano. Vocabulário. p. 459.
  13. Sampaio, Teodoro. O TUPI NA GEOGRAFIA NACIONAL. 5° edição. Comemorativa do cinquentenário de falecimento do autor. P, 137.
  14. Nogueira, Paulino. Vocabulário indígena. Em uso na província do Ceará. p. 423.
  15. Sobrinho, Pompeu. Revista do Instituto do Ceará. P, 259.
  16. Sobrinho, Pompeu. Pré-História Cearense. 1° tomo. Editora "Instituto do Ceará". 1955. p. 80,81.
  17. BUENO, E. Brasil: uma história. Segunda edição revista. São Paulo. Ática. 2003. p. 18,19.
  18. Galvão, R. Arte Tremembé. Fortaleza: SEBRAE-CE. 2005
  19. D‘ABBEVILLE, Cláudio. História da missão dos padre capuchinhos na Ilha do Maranhão [1614]. São Paulo: Siciliano, 2002.
  20. Revista Universidade Pública Ano III -N° 12. Fortaleza: UFC. Julho/Agosto 2002
  21. «Saga do povo Tremembé em Raposa é destaque no Repórter Mirante» 
  22. Elizabeth Maria Beserra Coelho. «"NÓS SOMOS UMA RESISTÊNCIA, NÃO SÓ NO BRASIL, MAS NO MUNDO": a luta dos Tremembé do Engenho» (PDF) 
  23. «Presidente do STF suspende reintegração de posse em Tremembé do Engenho em São José de Ribamar». Jornal Pequeno. 5 de novembro de 2020. Consultado em 21 de novembro de 2021 
  24. a b Gustavo de Almeida, Geraldo. HERÓIS INDÍGENAS DO BRASIL. Livraria Editora Catedra. Rio de Janeiro, 1988. P. 113.
  25. Instituto brasileiro de geografia e estatística (IBGE). https://biblioteca.ibge.gov.br/biblioteca-catalogo.html?id=3563&view=detalhes. Consultado em 28 de novembro de 2022.
  26. «Cópia arquivada». Consultado em 8 de fevereiro de 2009. Arquivado do original em 9 de julho de 2010 
  27. BORGES, J. F.; Os Senhores das Dunas e os Adventícios d’além--mar: Primeiros contatos, tentativas de colonização e autonomia Tremembé na costa leste-oeste (SÉCULOS XVI e XVII). Tese (Doutorado em História). Universidade Federal Fluminense. Niterói. 2010.
  28. https://poemia.wordpress.com/2009/06/07/danca-do-caroco/
  29. https://naturturismo.com.br/pb/tutoia/
  30. Sobrinho, Pompeu. Pré-História Cearense. 1° tomo. Editora "Instituto do Ceará". 1955. p. 80.
  31. Sobrinho, Pompeu. ÍNDIOS TREMEMBÉ. Revista do instituto do Ceará. 1951. p. 258

Ligações externas[editar | editar código-fonte]

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