Terceira via – Wikipédia, a enciclopédia livre

 Nota: Se procura pelo conjunto de correntes neofascistas, veja Terceira posição.
Bill Clinton e Tony Blair, dois entusiastas da terceira via.

A terceira via é uma corrente que surge no distributismo e mais tarde na ideologia social-democrata e liberalismo social. Tenta reconciliar os posicionamentos econômicos tradicionalmente associados à direita e à esquerda, adotando uma política econômica ortodoxa e políticas sociais progressistas. Ela não é necessariamente uma alternativa à dicotomia política entre esquerda e direita, mas sim uma alternativa às propostas econômicas do liberalismo econômico e do socialismo.[1]

Normalmente é encarada como uma corrente que apresenta uma conciliação entre capitalismo de livre mercado e socialismo democrático, sendo considerada um ramo do "centrismo radical" por Anthony Giddens, um dos seus principais formuladores. Entretanto, alguns de seus proponentes a enxergam como uma vertente modernizadora da social-democracia, classificando-a como uma "nova centro-esquerda".[2][3] No entanto, com o passar dos anos, essa vertente ideológica apresentou condutas que a aproximou muito mais das ideias de direita do que das ideias de esquerda.[4]

A terceira via tem sua origem no governo trabalhista que emergiu na Austrália no final da década de 1980. Popularizou-se durante o governo de Bill Clinton nos Estados Unidos, sendo também defendido por sua esposa, senadora e, posteriormente, secretária de estado, Hillary, durante a campanha presidencial de 2008. O primeiro-ministro britânico Tony Blair e sua facção dentro do Partido Trabalhista, o New Labour, foram os defensores mais entusiastas da corrente.[carece de fontes?]

Esta corrente de pensamento defende um "Estado necessário", em que sua interferência não seja, nem máxima, como no socialismo soviético, nem mínima, como no neoliberalismo. Também defende, entre outros pontos, a responsabilidade fiscal dos governantes, o combate à miséria, uma carga tributária proporcional à renda, com o Estado sendo o responsável pela segurança, saúde, educação e a previdência.

História[editar | editar código-fonte]

Desde meados do século XIX, após o aparecimentos da Revolução Industrial surge a história de dois sistemas econômicos adversários o socialismo e o capitalismo fundado no liberalismo deixando espaço a outros. Durante a década de 1920 G. K. Chesterton, juntamente com seu amigo Hilaire Belloc, criam o que chamaram de Distributismo. Uma teoria econômica baseada nos princípios nos ensinamentos cristãos, referidos anteriormente na encíclica do Papa Leão XIII, Rerum Novarum, que este propõe o direito à propriedade privada para todos chamando a atenção que ambos os sistemas acima referidos não o permitiam. Será sob essa égide que, no dia 17 de setembro de 1926, eles criaram a Liga Distributista e à qual propunha divulgar àquilo que chamavam uma "terceira via".

Muito mais tarde, em 5 de fevereiro de 1998, será o então primeiro-ministro britânico Tony Blair anunciou, em Washington, D.C., junto com o presidente estadunidense Bill Clinton, a decisão de convocar uma reunião internacional para discutir e atualizar a social-democracia, criando um movimento que foi denominado de "Terceira Via".[5] Naquela época, o líder trabalhista britânico despontava como uma liderança mundial, conseguindo reunir sucessivamente, em Florença, Washington e Londres, figuras como Bill Clinton, Lionel Jospin, Gerhard Schröder, Massimo D'Alema, Fernando Henrique Cardoso, António Guterres e Ricardo Lagos, entre outros governantes e intelectuais ligados de uma forma ou outra à social-democracia europeia, ou ao Partido Democrata estadunidense.[5]

O projeto comum das lideranças reunidas era construir um novo programa que adequasse a velha social-democracia às novas ideias e políticas neoliberais, hegemônicas desde a ascensão de Margaret Thatcher e Ronald Reagan.[5] De acordo com o economista José Luís Fiori, "o resultado foi uma geleia ideológica, com propostas extremamente vagas e imprecisas", voltado para a abertura, desregulação e desestatização das economias nacionais.[5] De acordo com a revista francesa Nouvelle Observateur, se tratou de um "prolongamento vagamente social da revolução thatcherista".[5]

A ideologia social-democrata deu uma contribuição decisiva à história do século XX, em particular devido à criação do "estado do bem-estar social" após a Segunda Guerra Mundial.[5] Entretanto, a partir da década de 1980, tal ideologia começou a perder fôlego político, o que acabou resultando em uma reformulação ideológica a partir das práticas neoliberais dos governos Thatcher e Reagan.[5] Isso se deu na Espanha, com Felipe González, na França, com François Mitterrand, na Itália, com Bettino Craxi, e na Grécia, com Andréas Papandréu.[5] Na década de 1990, esta reformulação adquiriu outra densidade, com a vitória de Bill Clinton para a presidência dos Estados Unidos e de Tony Blair para o cargo de primeiro-ministro britânico.[5]

Na América Latina, o processo deu-se de maneira diferente, uma vez que as políticas neoliberais apareceram associadas à questão da renegociação da dívida externa do continente, como se fosse um problema de política econômica.[5] Apenas no Chile e no Brasil, que a proposta da terceira via teve grande repercussão.[5] No caso do Chile, esse destaque se deu a partir da consolidação da aliança entre o Partido Socialista e o Partido Democrata Cristão durante o governo de Ricardo Lagos (2000-2006), que aderiu pessoalmente ao projeto.[5] No Brasil, o destaque se dá a partir da consolidação do Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB) e da participação ativa do presidente Fernando Henrique Cardoso (1995-2002), na formulação das ideias do movimento, ao lado de Blair e Clinton.[5]

A terceira via começou a perder fôlego na década de 2000, em parte devido à derrota nas urnas de seus líderes mais importantes.[5] O idealizador do movimento, Tony Blair, foi afastado da liderança do Partido Trabalhista em 2007, enfrentando forte oposição da imprensa e da opinião pública inglesa devido à denúncia de que teria mentido para justificar a entrada de seu país na Guerra do Iraque.[5] Seu substituto, Gordon Brown, também ideólogo da terceira via acabou sofrendo uma das derrotas eleitorais mais arrasadoras da história do partido.[5]

O presidente francês Emmanuel Macron e seu partido Renascimento (RE) são considerados como encarnando essa terceira via, por sua rejeição da divisão tradicional esquerda/direita e sua síntese entre socialismo e liberalismo.[6][7][8]

Ideólogos[editar | editar código-fonte]

Um dos principais defensores e difusores do pensamento da Terceira Via é o sociólogo britânico Anthony Giddens. Ele expõe regularmente suas visões por meio de contribuições ao think tank Policy Network do Reino Unido. Outros acadêmicos que contribuíram para esse pensamento foram Robert Putnam, Ian Winter e Mark Lyon, entre diversos.

Ver também[editar | editar código-fonte]

Referências

  1. Do liberalismo à terceira via: reflexões para o modelo de estado brasileiro - artigo UNICAMP
  2. Vieira, Evaldo (1 de agosto de 2013). «A Social-Democracia, longo caminho até a terceira-via» (PDF). Currículo Sem Fronteiras. Consultado em 10 de maio de 2019 
  3. Pavese, Carolina. «A Terceira Via» (PDF). Consultado em 10 de maio de 2019 
  4. Terceira Via. Por Antonio Gasparetto Junior. Infoescola.
  5. a b c d e f g h i j k l m n o p Fiori, José Luís. "Requiescat in pace". 25 de agosto de 2010.
  6. «Macron, la troisième voie». Le Monde (em francês). 1 de março de 2017. Consultado em 5 de janeiro de 2018 
  7. «"Révolution" : la troisième voie d'Emmanuel Macron». Le Point (em francês). 24 de novembro de 2016. Consultado em 5 de janeiro de 2018 
  8. «Rocard, Blair, Clinton... Macron dans l'histoire de la "Troisième voie"». France Culture (em francês). 17 de maio de 2017. Consultado em 5 de janeiro de 2018