Saúde indígena no Brasil – Wikipédia, a enciclopédia livre

Mapa dos "Distritos Sanitários Especiais Indígenas" do Brasil

A saúde indígena é um tema central na luta dos povos indígenas pela conquista de seus direitos, dada a precária situação, em termos de acessos aos serviços, a que eles estão submetidos no Brasil. Para melhor compreensão acerca da realidade brasileira, é necessário resgatar alguns princípios sobre saúde e o entendimento do processo saúde e doença, levando-se em conta as especificidades culturais de cada uma das etnias presentes no país.

Segundo os princípios que constam no relatório da III Conferência Nacional de Saúde Indígena,[1] realizada em 2001,

“… cada povo indígena tem suas próprias concepções, valores e formas próprias de vivenciar a saúde e a doença. As ações de prevenções, promoções, proteção e recuperação da saúde devem considerar esses aspectos, ressaltando os contextos e o impacto da relação de contato interétnico vivida por cada povo…”.

Foi dessa compreensão, que emergiu a necessidade de entender que o processo saúde e doença é parte integrante de contextos socioculturais e, portanto, deve ser abordado, no âmbito das políticas de saúde, de forma a contemplar a participação social, a intersetorialidade, a integralidade das ações e, sobretudo, a diversidade cultural, em se tratando das populações indígenas.

A antropóloga Luciane Ouriques Ferreira analisando acordos e posições dos representantes do Estado e de comunidades indígenas nos encontros realizados no Acre, em 2006, reunindo médicos, parteiras, pajés e agentes indígenas de saúde de diferentes etnias considera que as medicinas tradicionais indígenas podem ajudar a ampliar a cobertura dos serviços de atenção à saúde dos povos indígenas em regiões de difícil acesso, bem como contribuir para a atenção diferenciada e integral, mas, para isso, os profissionais de saúde precisam comunicar-se de forma intercultural e construir, junto com as comunidades, rotinas de cuidados que articulem saberes e práticas de horizontes epistemológicos distintos.[2]

Demandas e necessidades[editar | editar código-fonte]

Na III Conferência Nacional de Saúde Indígena constatou-se precariedade das condições de saúde, com taxas de morbimortalidade muito superiores às da população brasileira em geral. Destacam-se nesse quadro que o perfil epidemiológico dos povos indígenas é marcado por altas taxas de incidência e letalidade por doenças respiratórias, diarréicas, doenças imunopreveníveis, malária e tuberculose, cardiopatia, doenças hemofílicas, doenças renais, câncer e outros.

Conforme os dados estatísticos [carece de fontes?] quanto à saúde indígena, é possível compreender e analisar melhor a situação da saúde dessas populações. Toda a precariedade da saúde indígena se revela nas estatísticas. A FUNAI reconhece que a mortalidade infantil entre os povos indígenas é superior à média nacional. Segundo levantamento do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o coeficiente de mortalidade infantil no Brasil em 2004 alcançou 25,1 para cada mil, e no caso dos indígenas ele alcançou, no mesmo ano, 47,48 para cada mil.

No Acre, o IBGE [carece de fontes?] divulgou um estudo que mostra que o nível de mortalidade de crianças indígenas é vinte vezes maior que o indicado pela Organização Mundial de Saúde (OMS), que é de três mortes para cada mil nascidos vivos.

Considerando a distribuição por faixas etárias, vemos que, entre os menores de um ano, a causa mais frequente de morte, no período de 2001 a 2003, está relacionada às afecções pré-natais, as quais estão intimamente ligadas às condições de saúde e nutrição, ao nível de escolaridade e de vida das mulheres, como também à qualidade da atenção no pré-natal e no parto. Os dados mostram que, para cada mil nascidos vivos, 60 acabaram morrendo devido à falta do exame pré-natal, à falta de higiene e a questões culturais.

Quase 50% das mortes são registradas entre menores de cinco anos de idade. As causas mais freqüentes são doenças transmissíveis, principalmente infecção respiratória, parasitose intestinal, malária e desnutrição.

As principais causas dos óbitos na população indígena adulta, em 2003, foram externas, seguidas das doenças do aparelho circulatório, respiratório e as doenças infecciosas e parasitarias.

Estes e outros se apresentam como grandes desafios neste momento histórico que vive as comunidades indígenas no Amazonas, na caminhada já iniciada há tempo pela garantia dos direitos e pela melhoria da vida das famílias.

O Instituto e Centro de Referência e Apoio à Saúde Indígena, através de vários atendimentos médicos realizados nas comunidades indígenas e na casa de saúde do índio (CASAÍ), têm contribuindo a este processo. A partir das necessidades que foram surgindo nas comunidades e no contexto da caminhada da organização indígena.

A necessidade da oferta deste projeto é fruto dos debates e discussões desenvolvidos no seio das organizações indígenas junto a outras entidades que apoiam a caminhada destes povos, entre as quais destaca o Movimento Nacional de Direitos Humanos – MNDH da Arquidiocese de Manaus, parceira direta na elaboração e execução desta proposta, e Casa de Saúde Indígena (CASAÍ), aonde, o Instituto vem prestando atendimento médico e realizando articulações na rede de atendimento do SUS.[carece de fontes?]

Tendo em vista um recorte mais específico da saúde indígena brasileira, a carência de políticas contra a biopirataria, por exemplo, também se configura como uma demanda significativa a ser tratada. A escassez de medidas protetivas contra esse fenômeno deixa populações nativas mais vulneráveis a explorações ilegais, violências e ainda afeta as relações interpessoais, a conexão da comunidade com o ambiente e até mesmo com a própria cultura[3].

A preservação das florestas desempenha um papel crucial na forma de organização da saúde em comunidades indígenas, pois os conhecimentos tradicionais consideram o homem uma parte integrante do meio, estando intrinsecamente ligado a ele através de diversas relações de interdependência. Desse modo, a biopirataria enquanto apropriação ilegal de saberes cria necessidades de se pensarem políticas públicas que protejam as comunidades tradicionais não somente enquanto corpo, mas também enquanto fontes produtoras de conhecimento[4].

Principais proposições da III Conferência[editar | editar código-fonte]

  • Garantir a assistência integral em todos os níveis da atenção primária e promoção da saúde à hospitalar
  • Implantar e implementar ações de Vigilância em Saúde destacando a Vigilância Epidemiológica com atenção especial às DST Doenças Sexualmente Transmissíveis e Ambiental
  • Fortalecimento do controle social;
  • Formação dos agentes de saúde indígena promovendo seu reconhecimento e inserção social
  • Desenvolvimento e/ou contratação de recursos humanos para os distritos sanitários indígenas com formação adequada para trabalharem com culturas diferenciadas.
  • Implantar e implementar os diversos programas de saúde definidos pelo Ministério da Saúde nas áreas indígenas (Sendo os programas Saúde da Criança; Saúde do Adolescente; Vacinação; Saúde da Mulher c/ Assistência pré natal e obstétrica e Controle de Zoonoses considerados prioridade)
  • Promover a articulação com os Núcleos e Centros de Atenção Psicossocial (NAPS e CAPS) para constituírem referência nos casos de maior gravidade em relação ao alcoolismo /saúde mental.
  • Promover articulações para aperfeiçoamento de medidas que proíbem a venda de bebida alcoólica aos índios com envolvimento do Ministério Público, estabelecendo medidas punitivas para coibir funcionários públicos civis e militares e trabalhadores de saúde que comercializam e/ou promovem a circulação de bebidas alcoólicas em terras indígenas.

Ver também[editar | editar código-fonte]

Referências

  1. Relatório Final III Conferência Nacional de Saúde Indígena PDF Jun. 2011
  2. Ferreira, Luciane Ouriques . A emergência da medicina tradicional indígena no campo das políticas públicas. Hist. cienc. saude-Manguinhos vol.20 no.1 Rio de Janeiro Jan./Mar. 2013 PDF Jul. 2013
  3. SILVA, M. N.; RIBEIRO, J. P. M.; FERREIRA, R. Biopirataria e explorações ocorridas no Brasil: um relato-denúncia de práticas criminosas contra povos indígenas. REAMEC-Rede Amazônica de Educação em Ciências e Matemática, Cuiabá, v. 9, n. 1, p. 1-21, jan/abril. 2021. Disponível em: https://doi.org/10.26571/reamec.v9i1.11668. Acesso em: 28 agosto 2023
  4. ELOY, C. C.; VIEIRA, D. M.; LUCENA, C. M.; ANDRADE, M. O. Apropriação e proteção dos conhecimentos tradicionais no Brasil: a conservação da biodiversidade e os direitos das populações tradicionais. Gaia Scientia, João Pessoa, v. 8, n. 2, p. 189-198, 2014.

Ligações externas[editar | editar código-fonte]