Renúncia do papa Bento XVI – Wikipédia, a enciclopédia livre

Renúncia Papal de Bento XVI
Renúncia do papa Bento XVI
Papa Bento XVI celebra a última Missa da Epifania de seu pontificado, em janeiro de 2013.
Outros nomes Renuntiatio muneris Benedictus XVI
Participantes Papa Bento XVI
Cúria Romana
Localização Vaticano
Data 11 de fevereiro de 2013 (anúncio)
28 de fevereiro de 2013 (renúncia)
Resultado
Anterior Conclave de 2005
Posterior Conclave de 2013
Morte e funeral de Bento XVI

A renúncia do papa Bento XVI foi anunciada na manhã do dia 11 de fevereiro de 2013, quando o Vaticano confirmou que ele renunciaria ao papado em 28 de fevereiro, às 20h.[1] A decisão de Bento XVI em renunciar ao cargo de líder da Igreja Católica o tornou o primeiro papa a abdicar do posto desde o papa Gregório XII, em 1415,[2] que o fizera durante a Grande Cisma do Ocidente, e o primeiro a renunciar sem pressão externa desde o papa Celestino V, em 1294.[3] Foi um gesto inesperado,[4] já que na história moderna os papas se mantiveram no cargo até a morte, para que só então fosse escolhido um sucessor.[4] O papa comunicou que sua saúde frágil era a razão de sua renúncia. O Conclave de 2013 elegeu seu sucessor, Francisco.

Antecedentes[editar | editar código-fonte]

Em 2010, Bento XVI deixou em aberto a possibilidade de uma renúncia de seu ministério em um livro escrito com Peter Seewald. Na obra, intitulada Luz do Mundo: O Papa, a Igreja e os Sinais dos tempos, afirmou que se "o papa não é mais fisicamente, psicologicamente e espiritualmente capaz [...] então tem o direito, e sob certas circunstâncias, a obrigação, de renunciar." Dois anos mais tarde, sua saúde começou a deteriorar-se por causa de problemas no coração, em razão disso ele foi incapaz de participar de inúmeros eventos públicos em comparação com os anos anteriores. Seu irmão, Georg Ratzinger, sabia dessa decisão meses antes do anúncio e concordou que era um fato óbvio, porque "[ele] se sentia cada vez mais velho [...]. Já não tem energia. Está num processo natural de envelhecimento, [...] deseja mais calma para sua velhice".[5] Em julho de 2012, o jornalista italiano Gianluigi Nuzzi, autor do livro Sua Santità. Le carte segrete di Benedetto XVI, afirmou: "É claro que há uma fadiga no Santo Padre em manter a Igreja unida ou, pelo menos, para o Vaticano." De acordo com o jornal L'Osservatore Romano, o Papa tomou a decisão de renunciar durante sua visita apostólica ao México e Cuba, em março de 2012.[6] Após a demissão, o Vaticano explicou que isso aconteceu devido principalmente a sua velhice, e não por causa de suas condições de saúde que são boas para uma pessoa dessa idade, uma declaração que vai de acordo com o anúncio feito pelo Pontífice.[7]

Renúncia[editar | editar código-fonte]

Bento XVI decidiu, em fevereiro de 2013 que, devido à sua idade avançada, iria renunciar.[8][9] Ele teria 85 anos de idade na data prevista para a sua retirada do cargo.

O Papa anunciou sua intenção de renunciar em língua latina na Sala del Concistoro do Palácio Apostólico, numa reunião de manhã cedo, em 11 de Fevereiro de 2013, que foi o Dia Mundial do Doente, um dia santo para o Vaticano. O encontro foi para anunciar a data da canonização de três mártires católicos, Antônio Primaldo e companheiros, Laura Montoya, e María Lupita García Zavala. Na cerimônia, conhecida como o "Consistório para a canonização do mártires de Otranto", ele disse aos presentes que tinha feito "uma decisão de grande importância para a vida da Igreja".[1][10]

Em um comunicado, Bento XVI citou sua fragilidade devido à idade avançada e às exigências físicas e mentais do papado. Ele também declarou que iria continuar a servir à Igreja "através de uma vida dedicada à oração". Em 17 de fevereiro de 2013, o Papa Bento XVI, falando em espanhol, pediu à multidão postada em frente à Praça de São Pedro, que orasse por ele e pelo próximo papa.[11] O motivo central da renúncia do papa Bento XVI foi insônia, segundo uma carta, que ele mesmo enviou a seu biógrafo semanas antes de sua morte, divulgada nesta sexta-feira (27) por uma revista alemã.[12]

O início do conclave para escolher seu sucessor deveria ocorrer entre 15 de março e 20 de março de 2013.

Declaração de renúncia[editar | editar código-fonte]

O papa Bento XVI em 2007
Íntegra da Declaração de Renúncia:[13]

Controvérsias[editar | editar código-fonte]

De acordo com o diretor da École Pratique des Hautes Études de Paris, Philippe Portier, o motivo da renúncia de Bento XVI ao Papado foi "a descoberta de um informe elaborado por um grupo de cardeais que revelava os abismos nada espirituais nos quais a Igreja Católica havia caído: corrupção, finanças obscuras, guerras fratricidas pelo poder, roubo massivo de documentos secretos, luta entre facções, lavagem de dinheiro. O Vaticano era um ninho de hienas enlouquecidas, um pugilato sem limites nem moral alguma onde a cúria faminta de poder fomentava delações, traições, artimanhas e operações de inteligência para manter suas prerrogativas e privilégios à frente das instituições religiosas". Segundo Portier, Joseph Ratzinger teve o mérito de expor o imenso buraco negro dos padres pedófilos, mas não o de modernizar a igreja ou as práticas vaticanas. "Desde 1981 seguiu o reino de seu predecessor '[João Paulo II], acompanhando vários textos importantes, que redigiu: a condenação das teologias da libertação dos anos 1984-1986; a encíclica Evangelium vitae, de 1995, a propósito da doutrina da igreja sobre os temas da vida; a Veritatis Splendor, um texto fundamental, redigido a quatro mãos com Wojtyla". As duas encíclicas ilustram, segundo seus críticos, a visão reacionária da Igreja sobre questões políticas, sociais e científicas do mundo contemporâneo.[14]

Para o filósofo Giorgio Agamben, "ao realizar a grande recusa, Bento XVI deu provas não de covardia, como Dante escreveu talvez injustamente sobre Celestino V, mas de uma coragem que adquire hoje um sentido e um valor exemplares." Segundo Agamben, a decisão de Bento XVI "chama novamente com força a atenção para a distinção entre dois princípios essenciais da nossa tradição ético-política, dos quais as nossas sociedades parecem ter perdido toda consciência: a legitimidade e a legalidade. Se a crise que a nossa sociedade está passando é tão profunda e grave é porque ela não põe em questão apenas a legalidade das instituições, mas também a sua legitimidade; não apenas, como se repete frequentemente, as regras e as modalidades do exercício do poder, mas também o princípio mesmo que o fundamenta e legitima [...] Diante de uma cúria que se esquece totalmente da própria legitimidade e persegue obstinadamente as razões da economia e do poder temporal, Bento XVI escolheu usar apenas o poder espiritual, do único modo que lhe pareceu possível: isto é, renunciando ao exercício do vicariato de Cristo. Desse modo, a própria Igreja foi posta em questão desde a sua raiz".[15]

Reações[editar | editar código-fonte]

Bento XVI chega de papamóvel a Praça de São Pedro para celebrar sua última Audiência Geral da quarta-feira antes da renúncia, no dia 27 de fevereiro de 2013
  •  Canadá - O primeiro-ministro Stephen Harper divulgou um comunicado dizendo que Bento XVI "terá sempre um lugar especial no coração dos canadenses" e " Laureen e eu nos juntamos a todos os canadenses em desejando o bem para o Papa Bento no futuro".[16]
  •  França - O presidente François Hollande disse que Bento XVI merece "respeito", mas não comentou sobre o assunto especificamente por ser interno à Igreja Católica Romana.[17]
  •  Alemanha - A chanceler Angela Merkel elogiou-o como "um dos pensadores religiosos mais importantes de nosso tempo", mencionou seus esforços no diálogo intercultural e disse sobre a sua influência sobre ela: "As palavras do papa me acompanharão por um longo tempo." O secretário de imprensa do governo, Steffen Seibert, disse que estava "comovido e tocado", enquanto "o governo alemão tem o maior respeito pelo Santo Padre, pelo que ele tem feito, por suas contribuições ao longo de sua vida para a Igreja Católica. [...] Ele deixou uma assinatura muito pessoal como um pensador à frente da Igreja, e também como um pastor".[18]
  •  Irlanda - O presidente Michael D. Higgins também estendeu seus melhores desejos para o Papa renunciar, reconhecendo seu compromisso pessoal com a Igreja Católica. Taoiseach Enda Kenny elogiou a "liderança forte" do Papa Bento XVI e "um grande serviço à Igreja", tanto na Irlanda e em toda a o mundo depois da renúncia do pontífice.[19]
  •  Itália - O primeiro-ministro Mario Monti disse que estava "muito abalado com essa notícia inesperada".[20][21][22][23][24]
  • Filipinas - O presidente Benigno Aquino III disse que "foi preenchido com grande pesar como a notícia do anúncio de que o Papa Bento XVI pretende abandonar o ministério petrino em 28 de fevereiro deste ano." Ele também lembrou a gratidão "as muitas orações e palavras de conforto que o Papa Bento XVI dedicou a filipinos em tempos de calamidade e desafio, e as suas palavras de encorajamento e de testemunho em muitos eventos que uniram os católicos, como a recente canonização de San Pedro Calungsod".[25]
  •  Reino Unido - O primeiro-ministro David Cameron elogiou Bento XVI, dizendo: "eu envio os meus melhores desejos para o Papa Bento XVI após o anúncio de hoje. Ele tem trabalhado incansavelmente para fortalecer as relações da Grã-Bretanha com a Santa Sé. Sua visita à Grã-Bretanha em 2010 é lembrada com grande respeito e afeto." Ele acrescentou que o papa "fará falta como um líder espiritual de milhões".[26]
  •  Estados Unidos - O presidente Barack Obama elogiou Bento XVI, dizendo: "Em nome dos americanos em todos os lugares, Michelle e eu gostaríamos de ampliar o nosso apreço e orações de Sua Santidade o Papa Bento XVI. Michelle e eu calorosamente lembramos do nosso encontro com o Santo Padre em 2009, e eu tenho apreciado o nosso trabalho em conjunto ao longo destes últimos quatro anos". Ele acrescentou que desejava "o melhor para aqueles que em breve se reunirão para escolher o sucessor de Sua Santidade o Papa Bento XVI".[27]

Ver também[editar | editar código-fonte]

Referências

  1. a b Davies in Rome, Lizzy (11 de fevereiro de 2013). «Pope Benedict XVI resigns due to age and declining health». The Guardian. Guardian Media Group. Consultado em 11 de fevereiro de 2013 
  2. Messia, Hada (11 de fevereiro de 2013). «Pope Benedict to resign at the end of the month, Vatican says». CNN. Consultado em 11 de fevereiro de 2013 
  3. Father Raymond J. de Souza (12 de fevereiro de 2013). «The Holy Father takes his leave». The National Post]]. Consultado em 12 de fevereiro de 2013. Arquivado do original em 23 de março de 2013 
  4. a b «Pope Benedict XVI in shock resignation». BBC News. BBC. 11 de fevereiro de 2013. Consultado em 11 de fevereiro de 2013 
  5. «Georg Ratzinger sabía hace meses». El Economista. 11 de fevereiro de 2013. Consultado em 11 de fevereiro de 2013 
  6. «Caída no influyó en renuncia de Benedicto XVI: Lombardi». Milenio.com. 14 de fevereiro de 2013. Consultado em 14 de fevereiro de 2013 
  7. «Dimisión del Papa no fue por problemas de salud: Vaticano». El Tiempo. 12 de fevereiro de 2013. Consultado em 17 de fevereiro de 2013 
  8. «The future is God's». L'Osservatore Romano. 12 de fevereiro de 2013. Consultado em 11 de fevereiro de 2013 
  9. «El Papa tomó la decisión de renunciar tras su visita a México y Cuba». CNNMéxico (em espanhol). Turner Broadcasting System. 11 de fevereiro de 2013. Consultado em 11 de fevereiro de 2013 
  10. Lavanga, Claudio; McClam, Erin; Jamieson, Alastair. «Pope Benedict XVI, citing deteriorating strength, will step aside Feb. 28». NBC News 
  11. «Pope Benedict tells cheering crowd to pray 'for me and next pope'». NBC News 
  12. «Papa Bento XVI renunciou por causa de uma insônia de 8 anos». G1. Consultado em 28 de fevereiro de 2023 
  13. «Declaratio». Libreria Editrice Vaticana. Consultado em 22 de fevereiro de 2013 
  14. Eduardo Febbro (14 de fevereiro de 2013). «A História secreta da renúncia de Bento XVI». Carta Maior 
  15. Agamben: Crise de legitimidade. Outras Palavras, 21 de agosto de 2015. Artigo publicado originalmente (em italiano) pelo jornal la Repubblica, de 16 de fevereiro de 2013, sob o título Cosa insegna alla politica la rinuncia di Ratzinger
  16. Prime Minister's Office (11 de fevereiro de 2013). «Statement by the Prime Minister of Canada on the resignation of Pope Benedict XVI». Prime Minister of Canada's Office. Consultado em 13 de fevereiro de 2013. Arquivado do original em 20 de maio de 2013 
  17. «Pope Benedict merits 'respect', Hollande says». The Local 
  18. «German government "moved" by Pope Benedict's resignation». Reuters. 11 de fevereiro de 2013. Consultado em 14 de fevereiro de 2013 
  19. «Kenny pays tribute to Pope Benedict». The Irish Times. 11 de fevereiro de 2013. Consultado em 12 de fevereiro de 2013 
  20. Stanglin, Doug (11 de fevereiro de 2013). «World leaders surprised, but respect pope's decision». USA Today 
  21. Benedict XVI: the revolutionary Pope? Resignation seen as 'eruption of modernity'. Por Peter Popham. The Independent, 11 de fevereiro de 2013
  22. Italy's PM Monti 'Greatly Shaken' by Pope Resignation. 11 de fevereiro de 2013.
  23. Recap: Pope Benedict XVI resignation reaction. BBC.
  24. Reaction to Pope Benedict XVI’s resignation: ‘We are sad that he will be resigning,’ says NY Cardinal Timothy Dolan. Por Vera Chinese, Erik Ortiz. New York Daily News, 11 de fevereiro de 2013.
  25. «Statement: The Presidential Spokesperson on the Pope's resignation, February 11, 2013 | GOVPH». Official Gazette of the Republic of the Philippines (em inglês). Consultado em 28 de fevereiro de 2022 
  26. «Statement from Prime Minister David Cameron following the resignation of Pope Benedict XVI». 10 Downing Street. 11 de fevereiro de 2013. Consultado em 12 de fevereiro de 2013 
  27. «Reações ante renúncia do Papa são de surpresa e respeito». Exame. 11 de fevereiro de 2013. Consultado em 28 de fevereiro de 2022 

Ligações externas[editar | editar código-fonte]

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