Reichskonkordat – Wikipédia, a enciclopédia livre

A assinatura do Reichskonkordat em 20 de julho de 1933 em Roma. (Da esquerda para a direita: o prelado alemão Ludwig Kaas, o vice-chanceler alemão Franz von Papen, cardeal Giuseppe Pizzardo, o Cardeal Secretário de Estado Eugenio Pacelli, o Cardeal Alfredo Ottaviani, e o embaixador alemão Rudolf Buttmann).

A Reichskonkordat (em português Concordata com o Reich) é a concordata que estabelece os direitos sobre a liberdade religiosa católica entre a Santa Sé e a Alemanha. O acordo foi assinado em 20 de Julho de 1933 pelo Cardeal Eugenio Pacelli e Franz von Papen em nome do Papa Pio XI e do presidente Paul von Hindenburg, respectivamente, sendo válido atualmente na Alemanha.

Principais termos da concordata[editar | editar código-fonte]

Os principais pontos da concordata são:

  • O direito à liberdade para a religião Católica Apostólica Romana. (Artigo 1)
  • As concordatas com os estados da Baviera (1924), Prússia (1929) e Baden (1932) continuavam a ser válidos. (Artigo 2)
  • Os clérigos deviam prestar um juramento de lealdade ao governador local ou presidente do Reich. (Artigo 16)
  • A religião católica podia ser ensinada em determinadas escolas (Artigo 21) e professores específicos para este ensino podiam ser contratados apenas com a aprovação do bispo da diocese local (Artigo 22).
  • Proteção das organizações católicas e da liberdade de prática religiosa. (Artigo 31)
  • Clérigos não podiam ser membros ativos dos partidos políticos. (Artigo 32)

Antecedentes[editar | editar código-fonte]

As regiões da Baviera, Renânia e Vestefália, bem como partes do Sudoeste, eram predominantemente católicas. No norte da Alemanha, com maioria protestante, católicos tinham sofrido certa discriminação. No final do século XIX, o chanceler Otto von Bismarck tentou eliminar as instituições e liberdade religiosa católicas na Alemanha[1]. Devido à isto, funcionários católicos desejavam uma concordata que garantisse fortemente as liberdades da Igreja Católica na Alemanha.

No nível dos estados, concordatas foram feitas com a Baviera (1924), Prússia (1929) e Baden (1932). Mas no nível nacional as negociações fracassaram por várias razões: a fragilidade do governo nacional, a oposição dos deputados socialistas e protestantes no Reichstag e a discórdia entre os bispos alemães e a Santa Sé.

Assinatura[editar | editar código-fonte]

Em 30 de janeiro de 1933, Adolf Hitler foi nomeado chanceler, até então o governo ainda era democrático e pluripartidário, Hitler desejando os votos do Partido do Centro Católico do Reichstag no intuito de conseguir aprovar a Lei de Concessão de Plenos Poderes de 1933[2][3][4], afirma desejar uma aproximação e uma concordata com a Santa Sé, para definir claramente quais os direitos da Igreja na Alemanha.[5] Em abril, Hitler enviaria o seu vice-chanceler de orientação católica Franz von Papen, a Roma, para oferecer negociações sobre uma Reichskonkordat. O cardeal Pacelli e Ludwig Kaas, ex-presidente do Partido do Centro Católico, iniciaram as negociação dos termos da concordata com Papen. Inicialmente as negociações foram difíceis, pois o cardeal Pacelli mostrava-se hostil ao nazismo.[6] A concordata foi finalmente assinada por Pacelli em nome do Vaticano e por von Papen em nome da Alemanha em 20 de julho (a assinatura ocorreu porque o Partido do Centro Católico votou a favor da Lei de Concessão de Plenos Poderes de 1933). Pouco antes a Alemanha assinou acordos semelhantes com as igrejas protestantes alemãs, dando origem à Igreja do Reich.

Violações durante o regime nazista[editar | editar código-fonte]

O governo nazista rapidamente violaria a concordata. Em 30 de julho, a Liga da Juventude Católica — pertencente ao Partido do Centro — começaria a ser dissolvida. Os sucessivos atos de violência antissemíticos, em especial as leis de esterilização obrigatória para as "raças inferiores" de 25 de julho, ofenderiam principalmente a Igreja Católica[5], que mantinha uma posição tradicional insistindo na doutrina de que "perante Deus todos são iguais independente de raça"[7], visão considerada ultrapassada na época[7], tendo em vista supostos avanços "científicos e biológicos" do racialismo.

Posteriormente milhares de clérigos católicos seriam perseguidos, assassinados ou mandados a campos de concentração por protestarem ou se manifestarem contra o regime nazista.[5] Por consequência, em 1937, a encíclica Mit brennender Sorge, do Papa Pio XI, condenou "o neopaganismo de ideologia nazista, especialmente sua teoria da superioridade racial (…)". A encíclica foi enviada à Alemanha e impressa em segredo para não ser apreendida pela Gestapo; foi distribuída a todos os bispos, padres e capelães e lida em todos os templos da Alemanha em 21 de março de 1937[8] (Domingo de Ramos — o dia do ano litúrgico em que as igrejas costumam ficar mais lotadas). Hitler reagiu violentamente através da Gestapo e recrudesceu fortemente a perseguição a católicos[8]. A encíclica Mit brennender Sorge foi o primeiro documento oficial de denúncia do nazismo feita por qualquer organização importante.[9]

As relações entre Igreja Católica e regime nazista estavam tão deterioradas que em 1938, quando o cardeal Theodor Innitzer recebeu Hitler em Viena, o Papa Pio XI e o cardeal Pacelli (futuro Papa Pio XII) ficaram indignados com esse ato adesista e Pacelli divulgou um aviso no L’Osservatore Romano declarando que a recepção a Hitler, oferecida pelo clero austríaco, não tinha endosso da Santa Sé.[6]

Reichskonkordat na atualidade[editar | editar código-fonte]

Com as violações da concordata pelo regime nazista e a condenação dele pela Igreja Católica, acreditava-se que a concordata ficara inválida. Mas ela não foi oficialmente abolida, e, após a queda do regime e a retomada dos direitos religiosos na Alemanha, clérigos católicos apelaram ao Tribunal Constitucional Federal da Alemanha (Bundesverfassungsgericht) pedindo esclarecimentos sobre o acordo. Em 26 de março de 1957, o tribunal decidiu que a concordata ainda era válida.

Referências

  1. Bismarck Kanzler und Dämon, Teil 2: Regierungsgewalt und Machtverlust (Bismarck, Chanceler e Demônio, Parte 2: Violência do Estado e Perda do poder). Apresentado pela TV Escola. 2009
  2. La Politica de Los Papas en El Siglo XX - Karlheinz Deschner (volume 1)
  3. O Papa de Hitler - John Cornwell
  4. «Cópia arquivada». Consultado em 29 de março de 2014. Arquivado do original em 15 de julho de 2014 
  5. a b c Ascensão e queda do Terceiro Reich - Triunfo e Consolidação 1933-1939. Volume I. William L. Shirer. Tradução de Pedro Pomar. Agir Editora Ldta., 2008. ISBN 978-85-220-0913-8
  6. a b Hitler’s Pope. John Cornwell. Imago Editora. 2000. Pág.: 222, 239, 252 e 355 respectivamente.
  7. a b Racism: A History (em português: Racismo: Uma História). Documentário da BBC apresentado pela TV Escola. 2009.
  8. a b Sales,Eugênio. O Globo, 8.11.2008, pg.7
  9. Bokenkotter, Thomas (2004). A Concise History of the Catholic Church. Doubleday. ISBN 0385505841.

Ligações externas[editar | editar código-fonte]