Marxismo estrutural – Wikipédia, a enciclopédia livre

Marxismo estrutural ou marxismo estruturalista é uma vertente do neomarxismo desenvolvida nos anos 1960, principalmente na obra filosófica de Louis Althusser e Étienne Balibar, no trabalho teórico sobre o Estado, de Nicos Poulantzas, e no trabalho antropológico-econômico de Maurice Godelier. Trata-se de uma abordagem da filosofia marxista com base no estruturalismo.

Foi influente na França, durante a década de 1960 e 1970, e também veio a influenciar filósofos, teóricos políticos e sociólogos de outros países.

Visão geral[editar | editar código-fonte]

O marxismo estrutural surgiu em oposição ao marxismo humanista que dominou muitas universidades ocidentais durante a década de 1970. Em contraste com o marxismo humanista, Althusser salientou que o marxismo era uma ciência que examinava estruturas objectivas.[1] Segundo ele, o marxismo humanista histórico e fenomenológico, baseado nos primeiros trabalhos de Marx, teria sido capturado por uma "ideologia humanista pré-científica".[2]

Por volta de meados da década de 1970 e ao longo da década de 1980, os teóricos marxistas começaram a desenvolver relatos marxistas estruturalistas sobre o estado, a lei e o crime. O marxismo estruturalista contesta a visão instrumentalista de que o Estado pode ser visto como o servidor direto da classe capitalista ou dominante. Enquanto a posição instrumentalista argumenta que as instituições do Estado estão sob o controle direto daqueles membros da classe capitalista em posições de poder estatal, a perspectiva estruturalista assume a posição de que as instituições do Estado devem funcionar de modo a assegurar viabilidade contínua do capitalismo em geral. Outra maneira que os marxistas colocam é que as instituições do Estado devem funcionar de modo a reproduzir a sociedade capitalista como um todo. O debate Miliband-Poulantzas entre o instrumentista Ralph Miliband e o estruturalista Nicos Poulantzas caracterizou o debate entre marxistas estruturais e instrumentais.[3]

Os estruturalistas vêem o estado em um modo de produção capitalista como tendo uma forma especificamente capitalista, não porque indivíduos particulares estejam em posições poderosas, mas porque o Estado reproduz a lógica da estrutura capitalista em suas instituições econômicas, legais e políticas. Assim, a partir de uma perspectiva estruturalista, pode-se argumentar que as instituições do Estado (incluindo suas instituições jurídicas) funcionam nos interesses de longo prazo do capital e do capitalismo, e não nos interesses de curto prazo dos membros da classe capitalista. Os estruturalistas argumentariam, assim, que o Estado e suas instituições têm um certo grau de independência em relação às elites específicas da classe dominante ou capitalista.

Interesses de classe de longo e curto prazo[editar | editar código-fonte]

O marxismo estrutural postula que o estado funciona para servir aos interesses de longo prazo da classe capitalista. Com base nas obras de Engels e Lenin, os marxistas estruturais postulam a ideia de que o Estado é um mecanismo de regulação do conflito de classes, a tensão irreconciliável entre o proletariado e a burguesia.[4][5] Ao regulamentar esses antagonismos em vez de eliminá-los - o que Lenin julgava impossível sem uma revolução violenta[4] - o Estado serve para estabilizar o sistema capitalista como um todo e preservar sua existência.

Estruturalistas diferenciam entre os interesses de longo prazo e de curto prazo da classe capitalista, a fim de descrever a necessidade do Estado para o sistema capitalista. Os interesses de curto prazo da burguesia incluem políticas que afetam a acumulação de capital no futuro imediato, como isenções fiscais, salários mínimos reduzidos, subsídios do governo etc. Eles sustentam que quando o Estado não está beneficiando os interesses de curto prazo da classe burguesa, está agindo em nome de seus interesses futuros. Consequentemente, quando o Estado parece atuar em favor do proletariado e não da burguesia (elevando salários mínimos, aumentando os direitos dos sindicatos de trabalhadores etc.), está servindo aos interesses capitalistas atendendo às demandas dos trabalhadores apenas o suficiente para evitar uma insurreição que poderia ameaçar o sistema como um todo. Como os interesses do proletariado e das classes capitalistas são contrários, o Estado é necessário para regular o sistema capitalista e assegurar sua preservação, forçando os capitalistas a concordar com as exigências dos trabalhadores, os quais, de outra forma, não sucumbiriam.[5]

Críticas[editar | editar código-fonte]

Em um artigo de 1971 para o Socialist Register, o filósofo polonês Leszek Kołakowski[6] empreendeu uma crítica detalhada do marxismo estrutural, argumentando que o conceito tinha falhas graves em três pontos principais:

Argumentarei que toda a teoria de Althusser é composta dos seguintes elementos: 1. banalidades do senso comum expressas com a ajuda de neologismos desnecessariamente complicados; 2. conceitos marxistas tradicionais que são vagos e ambíguos no próprio Marx (ou em Engels) os quais ainda permanecem, após a explicação de Althusser, exatamente tão vagos e ambíguos como eram antes; 3. algumas inexatidões históricas impressionantes.

Kołakowski argumentou ainda que, apesar das alegações de rigor científico de Althusser, o marxismo estrutural era infalsificável e, portanto, não científico, e era mais bem entendido como uma ideologia quase religiosa. Em 1980, o sociólogo Axel van den Berg[7] descreveu a crítica de Kołakowski como "devastadora", provando que "Althusser retém a retórica ortodoxa radical simplesmente cortando todas as conexões com fatos verificáveis".

Argumentos semelhantes têm sido feitos em relação às teorias estruturais da natureza capitalista do Estado. Claus Offe afirmou que o caráter de classe do estado só poderia ser observado em uma perspectiva ex post. Em outras palavras, o caráter de classe do estado só pode ser visto depois que as políticas são postas em prática e o resultado é observado. Por causa disso, ele critica as teorias estruturais que tentam provar o caráter capitalista do Estado, alegando que o fazem de forma infundada: porque os resultados das políticas do Estado são empiricamente capitalistas, isso não faz do Estado um empreendimento capitalista em sua natureza.[5]:45–46

Referências[editar | editar código-fonte]

  1. Althusser, L. (1971). Lenin and Philosophy. In Lenin and Philosophy and Other Essays. NY: Monthly Review Press.
  2. Heine Andersen; L. B. Kaspersen (ed.). Classical and Modern Social Theory, Blackwell publishers, Oxford, 2000.
  3. Poulantzas, N. & Miliband R. (1972). The Problem of the Capitalist State. In R. Blackburn (ed.) Ideology in Social Science: Readings in Critical Social Theory. NY: Pantheon Books, pp. 238–262.
  4. a b Lenin, V.I. (2004/1917). The State and Revolution. Whitefish, MT: Kessinger Publishing.
  5. a b c Offe, Claus (1974). Structural Problems of the Capitalist State: Class Rule and the Political System. In Klaus von Beyme (ed.) German Political Studies, vol. 1. Beverly Hills, CA: Sage Publishing.
  6. Kołakowski, Leszek (1971), "Althuser's Marx". Socialist Register 1971, pp. 111–28.
  7. Van den Berg, Axel (1980). "Critical Theory: Is There Still Hope?" The American Journal of Sociology, Vol. 86 No. 3 (Nov 1980), pp. 449–478.