Manuel Botelho – Wikipédia, a enciclopédia livre

Manuel Botelho
Manuel Botelho
Nascimento 1950 (74 anos)
Lisboa
Nacionalidade Portugal portuguesa
Ocupação arquitecto e artista plástico

Manuel Botelho (Lisboa, 1950 —), é um arquiteto e artista plástico português.

Biografia[editar | editar código-fonte]

Manuel Botelho é filho de José Rafael Botelho e Maria Leonor Botelho; neto de Carlos Botelho. Vive e trabalha em S. Pedro do Estoril.

Licenciou-se em arquitetura pela Escola Superior de Belas Artes de Lisboa em 1976.

Foi colaborador no ateliê de Manuel Tainha[1] (1971-1975). Trabalhou em associação com José Rafael Botelho (1977-1983) e João Abel Manta (1976-1981). Foi professor do ensino secundário (1976-78, 1993-95) e no Ar.co, Lisboa (1992-95). Abandonou a arquitetura em 1983.[2]

Estudou pintura como bolseiro da Fundação Calouste Gulbenkian na Byam Shaw School of Art (1983-85) e na Slade School of Fine Art (1985-87), Londres.[2]

É docente na Faculdade de Belas-Artes da Universidade de Lisboa desde 1995.

Em 2006 concluiu o doutoramento na Universidade de Lisboa, Faculdade de Belas Artes, com uma tese intitulada: "Percursos paralelos: um projeto pessoal de pintura e uma análise da obra de Guston".

Obra[editar | editar código-fonte]

Desde o início a obra de Botelho revela preocupações de ordem político-social. Nas suas colagens de juventude, datadas de 1968-69 aborda os acontecimentos de Maio de 1968 em Paris e a Guerra no Vietname. Nos anos que se seguem dedica-se sobretudo à arquitetura e a sua prática artística permanece marginal e intermitente.[2]

Depois de se mudar para Londres em 1983 – cidade onde irá manter um estúdio até 1996 –, o seu trabalho torna-se mais alegórico, mais preocupado com questões de identidade, pessoal e coletiva. O interesse que então lhe desperta a revelação do inconsciente prende-se com a sua fascinação de sempre por Goya. A "poética e iconografia [de Botelho] mergulham na revelação adolescente das Pinturas Negras de Goya […] no Museu do Prado".[3]

No início dos anos 80 utiliza desenhos e pinturas para aludir à sua vida pessoal, a sentimentos de perda e separação. Em simultâneo, procura as suas raízes no passado, refletindo sobre o modo como o presente parece ensombrado por memórias de 41 anos de opressão ditatorial (Estado Novo – 1933-74)."Sentimos que não se trata do pesadelo pessoal de Botelho mas de um pesadelo coletivo; a temática que o ocupa é a estrutura ruinosa de toda uma sociedade".[4] Na Byam Shaw Botelho dava-nos "uma nova visão da opressão, com um elenco de personagens arquetípicas, dirigido pela figura do Padre/Bispo/Ditador […]"; e no momento que chegou à Slade descobria "uma iconografia original, um mundo de burros e casebres, de camponeses a trabalhar a terra com alfaias primitivas, de muros de pedra a desintegrar-se – um passado pré industrial que figura como metáfora do Portugal moderno".[5]

Esta visão negra foi-se lentamente aliviando, e os "temas de agressão e domínio [deram] lugar a uma iconografia mais íntima e pessoal"; a procura formal, a estruturação do espaço da pintura, tornaram-se prioridades na sua revisitação do cubismo sintético de Picasso, em pinturas onde "o erotismo ou a sensualidade mais genérica da relação entre mãe e filho"[6] tornaram-se em temas principais.

O progressivo afastamento do cubismo permitiu que o seu desenho se tornasse mais fluido e sensível, e uma nova dinâmica libertou as suas figuras da imobilidade. No final dos anos 90 as suas representações multifacetadas tanto aludiam à vida do dia-a-dia como a temas religiosos tradicionais, anulando o espaço entre "o profano e o sagrado, entre a temporalidade contemporânea e a intemporalidade".[7]

Em 2006 faz nova inflexão, e introduz a fotografia na sua obra, "para construir um corpo de trabalho que, no entanto, reflete as características essenciais da sua prática: a observação de questões de ordem histórica, as referências à tradição pictórica Ocidental, a figuração enquanto assinatura estilística".[8] Para o seu projeto Confidencial/Desclassificado, centrado na Guerra Colonial (1962-74), trabalhou durante 15 meses no Museu Militar em Lisboa, fotografando as armas utilizadas por ambos os lados do conflito, dos canhangulos improvisados e catanas às emblemáticas G3 e AK-47. E em séries subsequentes optou por um tipo de narrativa próxima da sua pintura anterior, registando "elementos de uma guerra concreta (a Guerra Colonial) para falar dessa guerra […] e também de todas as outras; ou ainda da guerra como realidade abstracta".[9] Escrutinando um acontecimento traumático através de uma narrativa de carácter alegórico, "Botelho explora a consciência coletiva portuguesa com sensibilidade, sem deixar de assinalar a turbulência política da era colonial".[8]

Os seus trabalhos de 2011-12 incluem obras tridimensionais de grande escala construídas com panos de tenda, bem como a instalação sonora Cartas de Amor e Saudade, onde são evocadas as rádio novelas da época. Baseado em cartas reais, trocadas entre um soldado em comissão na Guiné e a sua namorada em Lisboa, "o texto situa-nos no tempo e no espaço e revela-nos a dimensão dos sentimentos: Portugal e Guiné, Anos de 1960e Guerra Colonial, Amor e Morte, Ciúme e esperança".[10]

Partindo de uma publicação do S.N.I. com um relato empolado da viagem do presidente Américo Thomaz a Angola (1963), em 2013 Manuel Botelho apresentou a performance e instalação vídeo Viagem Triunfal (Old School, curadoria de Susana Pomba).[11]

Exposições[editar | editar código-fonte]

Participou em diversas exposições coletivas, em Portugal e no estrangeiro.

Entre as suas exposições individuais podem destacar-se: Fundação Calouste Gulbenkian[12] (1986 e 1994); Museu Nacional de Arte Antiga (2000); Centro de Arte Moderna José de Azeredo Perdigão, Fundação Calouste Gulbenkian, Lisboa, 2005; Museu de Arte Contemporânea de Elvas (2008); Centro Cultural de Lagos (2005, 2009); Fundação EDP (2008); Centro Cultural de Cascais (2011); Laboratório das Artes, Guimarães (2012); Fundação PLMJ, Lisboa (2012); Old School (2013).

Expôs em galerias como: Módulo, Lisboa (1987, 1989, 1991, 1995, 1998, 2001, 2003); Módulo, Porto (1987, 1988, 1990, 1991, 1994, 1996, 1998, 2001); Flowers East, Londres (1992); Lisboa 20 / Miguel Nabinho, Lisboa (2006, 2008, 2009); Fernando Santos, Porto (2009); João Esteves de Oliveira, Lisboa (2007); Gomes Alves, Guimarães (1992, 2002, 2005, 2008), etc.

Ver também[editar | editar código-fonte]

Referências

  1. Tainha, Manuel – Manuel Tainha; Projetos 1954-2002. Lisboa: Edições Asa, 2002, p. 273, 276, . ISBN 972-41-3113-0
  2. a b c Botelho, Manuel – Manuel Botelho: Pintura e desenho. Lisboa: Estar Editora Lda., 2000.
  3. Pinharanda, João – "Vida Mundial e autorretratos". In: Botelho, Manuel – Manuel Botelho: Desenho e Pintura, 1984-2004. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 2005, p. 9.
  4. Hyman, Timothy. In: Botelho, Manuel – Manuel Botelho: Pintura e Desenho 84/86. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1986, p. 5.
  5. Hyman, Timothy. In: Botelho, Manuel – Manuel Botelho: Pintura e Desenho 84/86. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1986, p. 9.
  6. Rosengarten, Ruth. In: Botelho, Manuel – Manuel Botelho. Londres: Flowers East, 1992, p. 4.
  7. Pinharanda, João – "Livro de enganos". In Botelho, Manuel – Manuel Botelho: Pintura e desenho. Lisboa: Estar Editora Lda., 2000, p. 116.
  8. a b Amado, Miguel – Manuel Botelho; Artforum Online, 2008.
  9. Pinharanda, João – "Os relatórios secretos de Manuel Botelho". In: Botelho, Manuel – Confidencial/Declassificado II: ração de combate. Lisboa: Fundação EDP, 2008.
  10. Pinharanda, João – "Conta-me como foi…". In: Botelho, Manuel – Manuel Botelho: cartas de amor e saudade. Cascais: Centro Cultural de Cascais, 2011, p. 10, 12.
  11. «Manuel Botelho - Viagem Triunfal; OLD SCHOOL #28». Artecapital. Consultado em 29 de abril de 2014 
  12. «Manuel Botelho». Centro de Arte Moderna. Consultado em 4 de fevereiro de 2012 

Bibliografia[editar | editar código-fonte]

  • Botelho, Manuel – Manuel Botelho: Pintura e desenho. Lisboa: Estar Editora Lda., 2000. ISBN 972-8095-78-3
  • Botelho, Manuel – Manuel Botelho: Desenho e Pintura, 1984-2004. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 2005. ISBN 972-635-162-6
  • Freitas, Maria Helena deManuel Botelho: o elogio da pintura. In: BOTELHO, Manuel – Manuel Botelho: Pintura 1990-94. Lisboa, Fundação Calouste Gulbenkian, 1994.
  • Hyman, Timothy. In: Botelho, Manuel – Manuel Botelho: Pintura e Desenho 84/86. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1986.
  • Monteiro, Joana Sousa – Manuel Botelho. Em: Silva, Raquel Henriques da (direção científica). Arte Portuguesa do século XX (CD-ROM). Lisboa: Instituto de Arte Contemporânea, 1998.
  • Pinharanda, JoãoO declínio das vanguardas, dos anos 50 ao fim do milénio. In: PEREIRA, Paulo (dir.). História da Arte Portuguesa, vol. III: do Barroco à Contemporaneidade. Lisboa: Círculo de Leitores, 1995.
  • Pinharanda, João – Livro de enganos. In: Botelho, Manuel – Manuel Botelho: Pintura e desenho. Lisboa: Estar Editora Lda., 2000. ISBN 972-8095-78-3
  • Pinharanda, João – Manuel Botelho. In: A.A.V.V. (coordenação de Leonor Nazaré). Centro de Arte Moderna José de Azeredo Perdigão: Roteiro da coleção. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 2004.
  • Pinharanda, João – Vida mundial e autorretratos [2005]. In: Botelho, Manuel – Manuel Botelho: Desenho e Pintura, 1984-2004. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 2005. ISBN 972-635-162-6
  • Pinharanda, João – Os relatórios secretos de Manuel Botelho [2008]. In: Botelho, Manuel – Confidencial/Desclassificado II: Ração de combate. Lisboa: Fundação EDP, 2008.
  • Pinharanda, João – Manuel Botelho…: a guerra continua. In: Botelho, Manuel – Manuel Botelho: Madrinha de Guerra. Lagos: Centro Cultural de Lagos, 2009. ISBN 978-972-8773-17-
  • Pinharanda, João – Conta-me como foi…. In: Botelho, Manuel – Manuel Botelho: cartas de amor e saudade. Cascais: Centro Cultural de Cascais, 2011. ISBN 978-972-8986-49-0.
  • Porfírio, José LuísVisitação. In: Manuel Botelho: Pintura e desenho 1997-2000. Lisboa: Museu Nacional de Arte Antiga, 2000.
  • Porfírio, José Luís – Aerogramas para 2010. In: A.A.V.V. (Org. Isabel Carlos) – Professores. Lisboa: CAM, Fundação Calouste Gulbenkian, 2010. ISBN 987-927-635-217-4
  • Rosengarten, Ruth. In: Botelho, Manuel – Manuel Botelho. London: Flowers East, 1992.
  • «AMADO, Miguel – Manuel Botelho, 2008, Artforum Online» 

Ligações externas[editar | editar código-fonte]