Gregório, o Patrício – Wikipédia, a enciclopédia livre

Gregório, o Patrício
Morte 647
Sufétula
Causa da morte batalha
Nacionalidade Império Bizantino
Ocupação patrício, exarco de Cartago, imperador de África
Religião Cristianismo

Gregório, o Patrício (também conhecido como Gregório de Cartago e Conde Gregório; em grego: Γρηγόριος; em latim: Flavius Gregorius; m. 647) foi um patrício bizantino que se notabilizou como exarco de Cartago (governador provincial). Parente da dinastia heracliana, Gregório foi um feroz calcedoniano e liderou uma rebelião em 646 contra o imperador Constante II devido ao apoio deste último ao monotelismo. Logo após declarar-se imperador, ele enfrentou uma invasão árabe em 647. Apesar de ter enfrentado os invasores, foi decisivamente derrotado e morto na sua capital, Sufétula. A África retornou à lealdade imperial depois de sua morte e da retirada dos árabes, mas os fundamentos do domínio bizantino haviam sido fatalmente comprometidos.

Biografia[editar | editar código-fonte]

Ruínas da igreja de São Servo, em Sufétula, a capital de Gregório

Gregório tinha laços de sangue com o imperador Heráclio (r. 610–641) e seu filho Constante II (r. 641–668), pois o seu pai, Nicetas, era primo de Heráclio. A primeira menção histórica a Gregório é de Teófanes, que o menciona como exarco de Cartago ("patrício de África") em julho de 645,[1][2][3] mas pode ter sido nomeado ainda durante o reinado de Heráclio.[4][5]

O exarcado encontrava-se então em turbulência interna, devido ao conflito entre a maioria de ortodoxos calcedônios e os partidários do monotelismo, uma tentativa de compromisso entre o calcedonismo e o monofisismo criado e promovido por Heráclio em 638. Na África, o último foi principalmente defendido por refugiados do Egito. Em um esforço para diminuir as tensões, em julho de 645 Gregório organizou um debate teológico em sua capital Cartago entre o calcedoniano Máximo, o Confessor e o monotelista e ex-patriarca de Constantinopla, Pirro. Gregório ajudou a promover a reconciliação entre os dois, e Pirro re-adotou a posição calcedoniana.[4][2][3] Ao longo dos meses seguintes, o monotelismo foi condenado como heresia em vários sínodos locais reunidos na África.[1]

Em 646, Gregório iniciou uma rebelião contra Constante. A razão óbvia foi o apoio deste último ao monotelismo, mas, sem dúvida, foi também uma reação à conquista muçulmana do Egito e à ameaça que esta representava para a África bizantina.[1] Dado ao fracasso do governo imperial em Constantinopla para parar o avanço muçulmano, foi, nas palavras de Charles Diehl "uma grande tentação para o poderoso governador da África de separar-se do império fraco e remoto que parecia incapaz de defender seus súditos". Diferenças doutrinárias e a autonomia de longa data do exarcado africano, reforçaram também essa tendência.[6]

Tremisse de Constante II (r. 641–668)
O Mediterrâneo à época da rebelião de Gregório

O cronista árabe Atabari por outro lado alega que a revolta de Gregório foi provocada por um tributo pedido por Constante de cerca de 90 quilos de ouro. Fontes árabes afirmam que após ele proclamar-se imperador ele cunhou moedas com sua efígie, mas até agora nenhuma foi encontrada.[2][7][8] Parece que ambos Máximo, o Confessor e o papa Teodoro I encorajaram ou ao menos ajudaram Gregório neste empreendimento. Assim, o papa supostamente enviou um emissário para transmitir um sonho de Marcos, segundo o qual dois coros de anjos rivais gritavam "Vitória de Augusto Constantino [Constante]" e "Vitória para Augusto Gregório", com o primeiro gradualmente silenciando-se.[1][3] A revolta parece ter encontrado amplo apoio entre a população, não só entre os africanos romanizados, mas também entre os berberes do interior.[7]

Em 642–643 os árabes haviam tomado a Cirenaica e a metade oriental da Tripolitânia, juntamente com Trípoli. A expansão islâmica para ocidente só parou por ordem do califa ortodoxo Omar (r. 634–644).[9] Em 647, contudo, o sucessor de Omar, Otomão (r. 644–656), ordenou que Abedalá ibne Sade e Abedalá ibne Zobair invadissem o exarcado com 20 000 homens. Os muçulmanos invadiram a Tripolitânia ocidental e avançaram até o limite norte da província bizantina de Bizacena. Gregório confrontou os árabes em seu retorno para Sufétula, mas foi derrotado e morto.[10][11] Agápio de Hierápolis em algumas fontes siríacas reivindica que ele sobreviveu à derrota e fugiu para Constantinopla, mas estudiosos mais modernos aceitam o registro das crônicas árabes de sua morte em batalha.[1][3][12] Os registros árabes também reivindicam que os muçulmanos capturaram a filha de Gregório, que lutou ao lado de seu pai. Ela foi levada de volta para o Egito como parte do espólio, mas caiu de seu camelo em marcha e foi morta.[2][13]

Após a morte de Gregório, os árabes saquearam Sufétula e invadiram todo o exarcado, enquanto os bizantinos retiraram-se para suas fortalezas. Incapazes de atacar as fortificações bizantinas, e satisfeitos com os lucrativos saques levados a cabo, os árabes concordaram em partir em troca do pagamento de um pesado tributo em ouro.[14] Apesar de não se terem registado mais ataques árabes durante algum tempo e dos laços do exarcado com Constantinopla terem sido restabelecidos, o domínio bizantino sobre a África foi agitado devido à rebelião de Gregório e à vitória árabe. As tribos berberes, em particular, não mantiveram a sua aliança com o império, e a maior parte do que é atualmente o sul da Tunísia parece ter saído da órbita de controle de Cartago.[15] Assim, a batalha de Sufétula marcou "o fim, mais ou menos próximo, mas inevitável, da dominação bizantina na África".[16]

Referências

  1. a b c d e Hollingsworth 1991, p. 875.
  2. a b c d Winkelmann 2000, p. 49–50.
  3. a b c d Martindale 2000, p. 554.
  4. a b Moore 1999.
  5. Pringle 1981, p. 46.
  6. Diehl 1896, p. 554–556.
  7. a b Diehl 1896, p. 557.
  8. Guery 1981, p. 66–68.
  9. Diehl 1896, p. 557–558.
  10. Diehl 1896, p. 558–559.
  11. Pringle 1981, p. 47.
  12. Diehl 1896, p. 556–557.
  13. Diehl 1896, p. 559.
  14. Diehl 1896, p. 559–560.
  15. Diehl 1896, p. 560–561.
  16. Diehl 1896, p. 562.

Bibliografia[editar | editar código-fonte]

  • Diehl, Charles (1896). L'Afrique Byzantine. Histoire de la Domination Byzantine en Afrique (533–709). Paris: Ernest Leroux 
  • Guery, R. (1981). «Le pseudo-monnayage de l'usurpateur Grégoire, patrice d'Afrique». Bulletin de la societé francaise de numismatique 
  • Hollingsworth, Paul A. (1991). «Gregory». The Oxford Dictionary of Byzantium. Nova Iorque: Oxford University Press. ISBN 978-0-19-504652-6 
  • Martindale, John Robert; Arnold Hugh Martin Jones; J. Morris (2000). The Prosopography of the Later Roman Empire, Volume III: A.D. 527–641. Cambridge: Cambridge University Press. ISBN 978-0-521-20160-5 
  • Moore, R. Scott (1999). «Gregory (646-47 A.D.)» (em inglês). Indiana University of Pennsylvania. Consultado em 18 de dezembro de 2015 
  • Pringle, Denys (1981). The Defence of Byzantine Africa from Justinian to the Arab Conquest: An Account of the Military History and Archaeology of the African Provinces in the Sixth and Seventh Century. Oxford: British Archaeological Reports. ISBN 0-86054-119-3 
  • Winkelmann, Friedhelm; Ralph-Johannes Lilie et al (2000). «Gregorios (# 2345)». Prosopographie der mittelbyzantinischen Zeit: I. Abteilung (641–867), 2. Band: Georgios (# 2183) – Leon (# 4270). [S.l.: s.n.] ISBN 978-3-11-016672-9