Fernando Lopes-Graça – Wikipédia, a enciclopédia livre

Fernando Lopes-Graça
Fernando Lopes-Graça
Nascimento 17 de dezembro de 1906
Tomar
Morte 27 de novembro de 1994 (87 anos)
Parede
Cidadania Portugal
Ocupação maestro, compositor, musicólogo
Prêmios
  • Grã-Cruz da Ordem do Infante Dom Henrique
  • Grande-Oficial da Ordem Militar de Sant'Iago da Espada
Assinatura

Fernando Lopes-Graça GOSEGCIH (Tomar, 17 de dezembro de 1906Parede, Cascais, 27 de novembro de 1994) foi um compositor, musicólogo, pianista, maestro, professor, investigador, teórico, crítico de arte e militante do Partido Comunista Português.[1] É considerado um dos maiores compositores e musicólogos portugueses do século XX.

Biografia[editar | editar código-fonte]

Nasceu em Tomar a 17 de dezembro de 1906, cidade sobre a qual escreveria que é onde «o monumento completa a paisagem; a paisagem é o quadro digno do monumento; e a luz é o elemento transfigurador e glorificador da união quase consubstancial da Natureza com a Arte.»

Apenas com 14 anos, começou a trabalhar como pianista no Cine-Teatro de Tomar, procedendo ele próprio aos "arranjos" dos trechos que interpretava, tocando peças de Debussy e de compositores russos contemporâneos. Na época, competiam em Tomar as duas bandas rivais: Gualdim Pais e a Nabantina.

Em 1923, frequenta o Curso Superior do Conservatório de Lisboa, tendo como professores: Adriano Meira (Curso Superior de Piano), Tomás Borba (Composição) e Luís de Freitas Branco (Ciências Musicais); em 1927, frequenta a Classe de Virtuosidade, onde tem como professor: Mestre Vianna da Motta (antigo aluno de Liszt), considerado o maior pianista português de todos os tempos.[carece de fontes?]

Em 1928, frequentaria também o curso de Ciências Históricas e Filosóficas na Faculdade de Letras de Lisboa, que viria a abandonar em 1931, em protesto contra a repressão a uma greve académica.

Entretanto, funda em Tomar o semanário republicano "A Acção".

Em 1931, no dia em que conclui, com a mais alta classificação, as provas de concurso para Professor de Solfejo e Piano do Conservatório Nacional, é preso pela polícia política, encerrado no Aljube e, a seguir, desterrado para Alpiarça.

Em 1934 concorre a uma bolsa de estudo, na área da música, para Paris. Ganha o concurso, mas a decisão do Júri é anulada por ordem da polícia política.

Em setembro de 1935 é de novo preso e enviado para o Forte de Caxias.

Em 1937 é libertado e parte para França por conta própria, aproveitando para ampliar os seus conhecimentos musicais, estudando Composição e Orquestração com Koechlin.

Em 1939 recusa a nacionalidade francesa, sendo forçado a regressar a Portugal.

Em 1940 é-lhe proposto dirigir os Serviços de Música da Emissora Nacional. Não chega a tomar posse do cargo porque recusa assinar a declaração de "repúdio ativo do comunismo e de todas as ideias subversivas" que, então, era exigida a todos os funcionários públicos.

Em 1945 integra o Movimento de Unidade Democrática (MUD), do qual virá a ser dirigente. No âmbito das atividades do MUD, Fernando Lopes-Graça cria o Coro do Grupo Dramático Lisbonense, mais tarde Coro da Academia dos Amadores de Música, após a sua morte o coro foi renomeado Coro Lopes-Graça da Academia de Amadores de Música como forma de homenagem.[2] As Canções Regionais Portuguesas e as Canções Heroicas são cantadas pelo Coro por todo o país. Adere ao Partido Comunista Português em 1948.[1]

A repressão por parte do regime cresce e acentua-se: na década de cinquenta as orquestras nacionais são proibidas de interpretar obras de Fernando Lopes-Graça; os direitos de autor são-lhe roubados; é-lhe anulado o diploma de professor do ensino particular; é obrigado a abandonar a Academia dos Amadores de Música, à qual só regressa em 1972. A sua ficha criminal por motivos políticos na Polícia Internacional e de Defesa do Estado revelada após a Revolução dos Cravos é composta por largas dezenas de páginas de espionagem diária do seu dia a dia.[1]

É autor de uma vasta obra literária incidente em reflexões sobre a música portuguesa e a música do seu tempo, mas maior ainda é a sua obra musical, da qual são assinaláveis os concertos para piano e orquestra, as inúmeras obras corais de inspiração folclórica nacional, o Requiem pelas Vítimas do Fascismo (1979), o concerto para violoncelo encomendado e estreado por Rostropovich, e a vastíssima obra para piano, nomeadamente as seis sonatas que constituem um marco na história da música pianística portuguesa do século XX, et caetera.

A 9 de abril de 1981 é feito Grande-Oficial da Ordem Militar de Sant'Iago da Espada e a 2 de fevereiro de 1987 é agraciado com a Grã-Cruz da Ordem do Infante D. Henrique.[3]

Em 1988 recebeu um Doutoramento Honoris Causa pela Universidade de Aveiro[4]

Obras Literárias[editar | editar código-fonte]

  • Disto e Daquilo
  • A Música Portuguesa e os seus Problemas
  • Cartas com Alguma Moral
  • A caça aos coelhos e outros escritos polémicos
  • Ensaios Musicológicos
  • Diário (quase)
  • Reflexões sobre Música
  • Opúsculos I, Opúsculos II, Opúsculos III
  • Música e Músicos Modernos
  • Talia, Euterpe & Terpsicore
  • A Canção Popular Portuguesa
  • Musicália

Cronologia da Obra Musical (seleção)[editar | editar código-fonte]

Ano Principais obras
1927 Variações sobre um tema popular português (piano).
1931 Primeiras versões das Sonatinas para violino e piano nº 1 e nº 2.
1934 Canções para voz e piano sobre poemas de Fernando Pessoa, Adolfo Casais Monteiro e António Botto.
1936 Canções sobre poesia de Afonso Duarte, Carlos Queiroz e José Régio.
1938 Escreve a música para o bailado “realista” La fièvre du temps e inicia o trabalho de harmonização de canções tradicionais portuguesas para voz e piano.
1939 Sonata nº 2 (piano) e canções sobre sonetos de Camões.
1940 Concerto para piano e orquestra nº 1 e suite orquestral A febre do tempo, baseado no bailado anterior.
1941 Três danças portuguesas, para orquestra.
1942 Primeiras versões do Concerto para piano e orquestra nº 2 e da cantata para voz e orquestra História Trágico-Marítima, baseada em poemas de Miguel Torga.
1943 Sinfonia per orchestra.
1946 Canções sobre poemas de José Gomes Ferreira, Cochofel, Carlos de Oliveira e Armindo Rodrigues. Primeiras harmonizações das Canções regionais portuguesas. Publicação das Marchas, danças e canções, consideradas as primeiras Canções heróicas.
1947 Trovas, para voz e piano, sobre textos tradicionais.
1949 Scherzo heróico para orquestra. Harmoniza as Six old english songs.
1950 Compõe, entre outras, as seguintes obras: Primeira cantata do Natal e Onze encomendações das almas, ambas para coro; Vinte e quatro prelúdios e Glosas sobre canções tradicionais portuguesas para piano; canções sobre poemas de Teixeira de Pascoaes, Fernando Pessoa, Luís de Camões e João José Cochofel.
1952 Sonata para piano nº 3.
1953 Primeira versão das Quatro canções de Federico Garcia Lorca.
1957 Conclui o segundo caderno das Melodias rústicas portuguesas para piano e inicia os Cinco nocturnos. Nestes anos, dedica-se sobretudo à música vocal e à revisão de obras anteriores.
1959 Conclui os Cinco nocturnos e o ciclo vocal As mãos e os frutos sobre poesia de Eugénio de Andrade, obras que o próprio compositor considerou pontos de viragem no seu percurso criativo.
1960 Dando continuidade à predominância da música vocal no seu catálogo, escreve canções sobre poesia de Fernando Pessoa, Vitorino Nemésio, Luís de Camões, Alberto de Lacerda e Sá de Miranda. Inicia a primeira das oito suites para piano In memoriam Bela Bartók.
1961 Compõe a primeira versão do Canto de amor e de morte e a Sonata para piano nº 4. Inicia os Quatro bosquejos para orquestra de cordas, Mar de Setembro (sobre poemas de Eugénio de Andrade) e os Três sonetos à noite (Bocage). "A Menina do Mar" um conto em quatro actos (sobre o conto homónimo de Sophia de Mello Breyner).
1962 Concertino para violeta.
1963 Cinco canções de “Os dias íntimos” (J. J. Cochofel)
1964 Quarteto de arcos nº 1. Dá início à cantata-melodrama D. Duardos e Flérida, baseada na obra de Gil Vicente, que será concluída em 1969.
1966 Sete lembranças para Vieira da Silva, para quinteto de sopro, e Concerto de câmara com o violoncelo obrigado, por encomenda de Mstislav Rostropovich.
1971 Versão para orquestra dos Seis cantos sefardins.
1974 Finaliza a orquestração da Fantasia sobre um canto religioso da Beira Baixa, para piano e orquestra.
1975 Conclui as oito suites In Memoriam Béla Bartók.
1979 Conclui o Requiem pelas vítimas do fascismo em Portugal.
1980 Sinfonieta em homenagem a Haydn, por encomenda da Orquestra Gulbenkian.
1981 Sonata para piano nº 6 e Sete apotegmas. Compõe a “Perpétua para a campa de Carlos de Oliveira”, primeira das Músicas Fúnebres em memória de amigos falecidos."
1982 Quarteto de arcos nº 2.
1984 Conclui o bailado Dançares.
1986 Em louvor à paz, para orquestra.
1987 Aquela nuvem e outras (Eugénio de Andrade) e outras canções, também para voz e piano, sobre textos de Pessoa e de dois dos seus heterónimos (Ricardo Reis e António de Campos).
1989 Geórgicas, dedicada ao agrupamento Opus Ensemble. Canciones de Tierras Altas (Antonio Machado).
1990 Tríptico de D. João (José Saramago).
1992 Jardim perdido, para coro (Sophia de Mello Breyner Andresen).
1994 Preito à Memória de Francisco Miguel, uma vida heróica, peça para piano.

Fernando Lopes-Graça atualmente[editar | editar código-fonte]

O compositor doou por testamento o seu arquivo à Câmara Municipal de Cascais. Conserva-se e pode ser consultado na Casa Verdades de Faria-Museu da Música Portuguesa (Monte Estoril).

Hoje em dia existe uma escola com o seu nome, situada na Parede, a Escola Secundária Fernando Lopes Graça.

Na Associação Académica de Coimbra os ensaios do Coro Misto da Universidade de Coimbra são realizados na sala que leva o nome deste grande maestro.

Em Tomar a casa onde nasceu o compositor foi transformada no Museu Fernando Lopes-Graça para homenagear a sua obra e o seu exemplo cívico.[carece de fontes?]

Ver também[editar | editar código-fonte]

Referências

  1. a b c Sousa 2006.
  2. «Coro Lopes-Graça». corolopesgraca.com. Arquivado do original em 17 de dezembro de 2014 
  3. «Cidadãos Nacionais Agraciados com Ordens Portuguesas». Resultado da busca de "Fernando Lopes Graça". Presidência da República Portuguesa. Consultado em 7 de março de 2015 
  4. «Doutores honoris causa pela UA». Universidade de Aveiro. Consultado em 22 de Agosto de 2014. Cópia arquivada em 28 de Julho de 2014 

Bibliografia[editar | editar código-fonte]

Leitura adicional[editar | editar código-fonte]

  • Ricardo António Alves e Teresa Cascudo (introdução, transcrição, notas), Fernando Lopes-Graça e a Presença. Correspondência, Lisboa, Imprensa Nacional-Casa da Moeda/Câmara Municipal de Cascais, 2013.
  • Patrícia Bastos, As sonatas e sonatinas para piano solo de Fernando Lopes-Graça, Tese de Doutoramento em Música, Universidade de Aveiro, 2007[1]
  • Alexandre Branco Weffort (ed.), A Canção Popular Portuguesa em Fernando Lopes-Graça, Lisboa, Caminho, 2006.
  • Gregory W. Brown, The Canções Regionais Portuguesas of Fernando Lopes-Graça (1906-1994): Methods and significance of the adaptation of folk materials into the choral medium, Tese de Doutoramento em Música, University of Georgia, 2006[2]
  • António de Sousa, A Construção de uma Identidade: Tomar na vida e obra de Fernando Lopes-Graça, Lisboa, Cosmos, 2006.
  • Júlia Miguel R. Bernardes, e Isabel Ramos S. Bernardes, Uma Discografia de Cds da Composição Musical em Portugal: Do Século XIII aos Nossos Dias, Lisboa, INCM, 2003, pp. 164-175.
  • Mário Vieira de Carvalho, O essencial sobre Fernando Lopes-Graça, Lisboa, Imprensa Nacional - Casa da Moeda, 1989.
  • Mário Vieira de Carvalho, Pensar a música, mudar o mundo: Fernando Lopes-Graça, Porto, Campo das Letras, 2006.
  • Mário Vieira de Carvalho, «Politics of Identity and Counter-Hegemony: Lopes-Graça and the Concept of 'National Music'», in: Music and Politics, 6/1 (2011) [3]
  • Mário Vieira de Carvalho, «Between Political Engagement and Aesthetic Autonomy: Fernando Lopes-Graça's Dialectical Approach to Music and Politics», in: Twentieth-Century Music, 8/2 (2011): 175-202 [4]
  • Teresa Cascudo, A tradição musical na obra de Fernando Lopes-Graça. Um estudo no contexto português, Sevilla, Editorial Doble J, 2010.
  • Teresa Cascudo, «Historia y composición en Portugal en el período de entreguerras: dos casos de estudio», in: María Isabel Cabrera García e Gemma Pérez Zalduondo (eds.), Cruce de caminos: Intercambios musicales y artísticos en la Europa de la primera mitad del siglo XX, Granada, Universidad, 2011, pp. 297-316.
  • Teresa Cascudo, «Música e identidade na obra de Fernando Lopes-Graça: Uma abordagem entre a história e a crítica», in: Manuela Tavares Ribeiro (ed.), Outros Combates pela História, Coimbra: Universidade, 2010, pp. 545-560.
  • Teresa Cascudo, «Art Music in Portugal during the Estado Novo». in: Roberto Illiano e Massimiliano Sala (eds.), Music and Dictatorship in Europe and Latin America, Turnhout, Prepols Publishers, Speculum Musicae, 14, 2010, pp. 363-381.
  • Teresa Cascudo, «À luz do presencismo: uma leitura da Introdução à música moderna (1942), de Fernando Lopes-Graça», Lecturas: revista da Biblioteca Nacional, 12-13, 2003, pp. 107-124.
  • Pedro Junqueira Maia (editor), Fernando Lopes-Graça, Porto, Atelier de Composição, 2010.
  • Romeu Pinto da Silva, Tábua Póstuma da Obra Musical de Fernando Lopes-Graça, Lisboa, Caminho, 2008.
  • Viriato Camilo, Fernando Lopes-Graça e o Coro da Academia de Amadores de Música, Lisboa, Seara Nova, 1990.

Ligações externas[editar | editar código-fonte]