Emília Viotti da Costa – Wikipédia, a enciclopédia livre

Emília Viotti da Costa
Emília Viotti da Costa
Nascimento 10 de fevereiro de 1928
São Paulo, SP, Brasil
Morte 2 de novembro de 2017 (89 anos)
São Paulo, SP, Brasil
Nacionalidade brasileira
Ocupação historiadora
professora

Emília Viotti da Costa (São Paulo, 28 de fevereiro de 1928 — São Paulo, 2 de novembro de 2017) foi uma historiadora e professora brasileira.[1]

Autora de diversos livros relacionados ao sistema colonial brasileiro, entre eles Da Senzala à Colônia, publicado pela Editora UNESP, que aborda a transição do trabalho escravo ao trabalho livre na zona cafeeira paulista e é considerado uma referência obrigatória para estudiosos do período.[2]

A historiografia de Emília Viotti da Costa está enraizada em uma perspectiva marxista, refletida em sua análise da formação do Brasil a partir de uma lente social e econômica. Sua obra Da Monarquia à República, por exemplo, examina a influência das elites agrárias na configuração do território brasileiro, evidenciando como a economia desempenha um papel crucial nesse processo. Viotti da Costa utiliza a perspectiva marxista para investigar como as relações de classe e os interesses econômicos moldam a história, oferecendo uma visão crítica das narrativas tradicionais.[3]

A historiadora abordava de forma significativa no livro Da Senzala à Colônia, em que ela aplica a teoria marxista para explorar a formação e a evolução das instituições sociais e políticas brasileiras, ressaltando a importância das estruturas econômicas e das lutas de classe. Sua análise crítica das elites e das dinâmicas de poder, bem como sua abordagem ao materialismo histórico, reflete um legado expressivo em sua interpretação da história, desafiando interpretações convencionais e oferecendo uma perspectiva mais profunda sobre os processos históricos no Brasil.[4]

Emília Viotti da Costa foi uma historiadora especializada em história social e econômica. Formada em História pela Universidade de São Paulo (USP). Em 24 de junho de 1999, tornou-se a 26ª professora emérita da universidade em que se formou. Suas pesquisas foram pioneiras nos estudos sobre a escravidão o movimento abolicionista e a transição da Monarquia para a República no Brasil. Além de sua contribuição acadêmica, Viotti foi uma pessoa que viveu em defesa dos direitos humanos e das liberdades democráticas.[5]

Iniciou sua trajetória acadêmica na Universidade de São Paulo, onde se formou em História em 1954. Após sua graduação, dedicou-se à docência e à pesquisa na mesma universidade, onde desenvolveu grande parte de sua carreira. Em 1964, concluiu seu doutorado com uma tese sobre a Abolição da Escravatura no Brasil, uma obra de notoriedade dentro do tema.[6]

Sua carreira foi marcada pelo engajamento com a história social e pela análise crítica dos processos históricos brasileiros, especialmente no que diz respeito à escravidão, abolição e às estruturas de poder. Em 1969, após o endurecimento do regime militar no Brasil, ela foi forçada a se exilar nos Estados Unidos, onde continuou sua carreira acadêmica. Nos Estados Unidos, lecionou em várias universidades, incluindo a Universidade Yale, Stanford e Illinois, onde se estabeleceu e tornou-se professora titular.[6] Como professora, Viotti influenciou a historiografia brasileira, promovendo uma abordagem crítica e interdisciplinar. Ela é conhecida por ter se tornado referência nos estudos de história da escravidão e da abolição.[7][1][4][8][9]

Criticas Historiográficas

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Nessa seção estão reunidos alguns resumos das obras de destaque de Emília Viotti da Costa e nelas contém a crítica historiográfica de cada uma dessas obras.

A dialética invertida e outros ensaios

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Em sua obra “A dialética invertida e outros ensaios”, escrito em 2014, Emília Viotti reúne seus ensaios produzidos em um intervalo de 40 anos, contendo tópicos como o problema dos degredados no povoamento do Brasil colonial, o movimento operário na América Latina, o tráfico de escravos na modernidade e a influência dos franceses em São Paulo. A autora apresenta na obra que sua preocupação é reconstruir o processo histórico pelo qual “homens e mulheres fazem a história, embora não a façam em condições por eles escolhidas, pois atuam sobre uma realidade que já encontram definida pelos antepassados”.[10]

Na obra, a autora tece a respeito do embate entre estruturalismo e anti-estruturalismo, buscando as raízes históricas da divisão historiográfica entre as duas ideias e grupos. Ao longo de sua defesa, Viotti aborda a importância da Nova História, especialmente para a história da classe operária na América Latina.[11]

Da Senzala à Colônia

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A obra Da Senzala à Colônia, trata da transição do trabalho escravo para o trabalho livre. Viotti analisa o impacto da abolição da escravatura na estrutura agrária e econômica do país, destacando como a abolição não significou uma mudança radical nas relações de trabalho, mas sim uma reconfiguração dos mecanismos de exploração da mão de obra. Ela também fala sobre as tensões e os desafios enfrentados por ex-escravizados e trabalhadores imigrantes no contexto de um sistema agrícola em transição.[12]

Ela trata da continuidade das práticas de exploração, ela descreve que a transição para o trabalho assalariado foi marcada por condições de trabalho desumanas e pela forte concentração de terras nas mãos da elite.[12] Ela mostra que há limitações na abolição formal da escravatura, apontando que embora a escravidão tenha sido legalmente extinta, as estruturas da sociedade permaneciam desiguais. Para Viotti, a chegada de imigrantes europeus incentivada pelo governo e sua inserção em fazendas de café não significaram um avanço civilizatório, mas uma nova forma de controle e exploração, mas com a proximidade com a modernidade.[4]

Viotti faz uma importante contribuição à historiografia brasileira[13], demonstrando como a transição do Brasil Imperial para a República não representou a ruptura esperada. Este livro demonstra as continuidades nas formas de dominação e exclusão social, mostrando que a libertação dos escravizados foi apenas uma pedaço de um processo mais longo e complexo de luta por direitos e dignidade.[14]

Em seu livro A Abolição,[15] Emília Viotti, procura fazer uma síntese sobre o processo da abolição da escravidão no Brasil. A obra abarca desde as primeiras ideias acerca da libertação dos escravos e como esse processo foi gradual no século XIX com a criação da lei Eusébio de Queirós, Lei dos Ventre Livre, Lei dos Sexagenários e Lei Áurea. Além disso, Emília também discorre em seu livro sobre o que aconteceu com os ex-escravizados após o processo de abolição. No primeiro capítulo do livro, intitulado de Da Defesa da Escravidão à sua Crítica, a pesquisadora traz uma reflexão histórica sobre a escravidão no período colonial e como ela era vista na época, trazendo também ideias e filosofias presentes no século XIX, como Iluminismo e Renascimento. Entretanto, o principal objetivo da autora nesse capítulo é trazer a luz sobre a possível libertação dos escravizados. A historiadora também escreve sobre as ideias abolicionistas no contexto da vinda da família real para o Brasil e o período de Regência. [16]

Em seu trabalho, Emília Viotti divide o abolicionismo em algumas fases: Na primeira fase, que vai de 1850 até 1871, ela fala sobre a intensificação do processo abolicionista, causada por diversos fatores. Alguns deles são a pressão externa de alguns países com relação ao Brasil, a Guerra Civil americana e a Guerra do Paraguai. A autora discorre sobre o processo da evolução do abolicionismo na metade do século XIX. [17]

Na segunda e terceira fases, Emília trata especificamente da lei do Ventre Livre, lei dos Sexagenários e de como a criação dessas lei foram uma tentativa de silenciar o movimento abolicionista. Nos próximos capítulos, a professora continua tratando das mudanças ocorridas até desembocar na abolição, além de chamar atenção para algumas figuras importantes nesse processo e o que ocorreu com os antigos escravizados. A obra é importante para conhecer de forma profunda e detalhada como ocorreu o processo de abolição, evento que, assim como a Escravidão, reverbera suas consequências até a contemporaneidade.[18]

Coroa de glória, lágrimas de sangue: a rebelião dos escravos de Demerara em 1823

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Em "Coroa de glória, lágrimas de sangue: a rebelião dos escravos de Demerara em 1823", Emilia Viotti da Costa apresenta um estudo detalhado sobre a Revolta de Demerara, ocorrida em 1823 na ex-Guiana inglesa. A autora utiliza diversas fontes históricas, como cartas, diários, jornais da época e processos judiciais, para reconstituir a história de uma das maiores revoltas de escravos nas Américas. Sua abordagem é dona de um estudo aprofundado sobre o tema, unindo conceitos de micro e macro história para fornecer um contexto mais amplo individual e coletivamente.[9]

A obra destaca a participação de um número que vai de 10 a 13 mil escravos no levante, assim como o papel dos missionários protestantes da London Missionary Society, com destaque para o missionário branco John Smith. Considerado pelos colonos como conivente ao movimento, Smith foi perseguido e condenado à morte. A sua capela de Bethel é frequentemente retratada pela autora como um espaço de solidariedade e resistência entre cativos.[9]

Viotti explora em seu livro tanto a dimensão religiosa quanto a escravocrata, revelando as tensões encontradas pelo caminho missionário nas terras da colônia e o modo de vida dos próprios escravos, indo além da clássica historiografia das práticas opressoras e resgatando também personagens, fé e modos de viver. A autora enfatiza a capacidade dos escravizados de agir como protagonistas de sua própria história, aprendendo a ler para interceptar cartas de seus senhores, e também se informando sobre os debates abolicionistas que chegavam da Inglaterra.[9]

A narrativa se passa no contexto histórico de grandes revoluções, como a recente Revolução Francesa, a Revolução Haitiana, e a própria Revolução industrial, destacando o impacto das novas ideias e debates da metrópole inglesa quanto à escravatura entre os próprios escravos. A retificação da proibição de frequentar a capela sem permissão é apontada como um estopim para o levante, uma vez que esta é entendida como uma afronta às iniciativas modernas advindas da metrópole. Apenas quatro ou cinco brancos foram mortos na revolta, porém o revide foi um verdadeiro massacre aos negros participantes, com centenas de mortos.[9]

Por fim, o livro examina a trajetória de John Smith e sua condenação, usada como símbolo tanto pelos colonos quanto pelos abolicionistas para dar forma aos seus próprios debates e argumentos. Para isto, eles desconsideram a motivação dos próprios escravos, os considerando sempre como agentes da intenção de outros. Viotti se destaca em sua historiografia por fazer o contrário, trazendo a voz dos negros envolvidos para o centro de seu próprio debate.[9]

Aqui estão reunidas todas as obras que Emília Viotti da Costa produziu e participou durante sua trajetória.

  • Da Senzala à Colônia (1966)
  • A Abolição (1982)
  • A Monarquia e a República no Brasil (1989)
  • O Supremo Tribunal Federal e a Construção da Cidadania (2001)
  • A Escravidão em São Paulo: A Negociação da Liberdade (2004)
  • Coroas de Glória, Lágrimas de Sangue: A Rebelião dos Escravos de Demerara, 1823"(1998)
  • O Sincretismo Religioso no Brasil (1980)
  • Dialética Invertida e a Reorganização do Projeto Colonial: Análise do Caso Português (1988)
  • História do Trabalho no Brasil (2006)
  • Imagens e Fantasias na Criação do Brasil (1994)
  • Ideologia Burguesa e Disciplina Operária (1977)
  • A Dialética Invertida: As Origens do Colapso da Economia Açucareira Colonial, 1750-1800 (1969)
  • Estudos de História (1984)
  • Introdução ao Estudo da Emancipação Política do Brasil (1964)

Verbetes relacionados

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Lei dos Sexagenários

História da agricultura no Brasil

Da Monarquia à República - momentos decisivos

Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo

  1. a b Costa, Emilia Viotti da (19 de maio de 1994). Impasse teórico da historiografia segundo Emília Viotti da Costa. [S.l.]: UNESP 
  2. «Emília Viotti vira emérita da USP» 
  3. «Síntese histórica e marxismo na obra de Emília Viotti» (PDF) 
  4. a b c «Resenha de: Da senzala à colônia» 
  5. ConJur, Redação (3 de novembro de 2017). «Morre, aos 89 anos, a historiadora Emília Viotti da Costa». Consultor Jurídico. Consultado em 28 de agosto de 2024 
  6. a b «Emília Viotti da Costa | História». historia.fflch.usp.br. Consultado em 28 de agosto de 2024 
  7. «Emília Viotti da Costa | História». historia.fflch.usp.br. Consultado em 31 de agosto de 2024 
  8. «Resumo- A abolição» 
  9. a b c d e f Barros, Surya (15 de fevereiro de 2012). «Coroa de glória, lágrimas de sangue: a rebelião dos escravos de Demerara em 1823». Sociedade Brasileira de História da Educação (SBHE). Revista Brasileira de História da Educação: 177-182. Consultado em 29 de agosto de 2024 
  10. «Impasse teórico da historiografia segundo Emília Viotti da Costa» 
  11. «resenhas & livros. COSTA, Emília Viotti da. A dialética invertida e outros ensaios» 
  12. a b Livro Da Senzala à Colônia. [S.l.: s.n.] 
  13. «Emília Viotti da Costa/ História» 
  14. «Escravidão no Brasil». Wikipédia, a enciclopédia livre. 31 de julho de 2024. Consultado em 9 de setembro de 2024 
  15. COSTA, Emília Viotti da. A Abolição. Rio de Janeiro: Editora Paz e Terra, 1980.
  16. https://www.scielo.br/j/rh/a/XxbTNMZYFpb3CcHrdtmsxHy/?format=pdf
  17. https://www.scielo.br/j/rh/a/XxbTNMZYFpb3CcHrdtmsxHy/?format=pdf
  18. https://www.scielo.br/j/rh/a/XxbTNMZYFpb3CcHrdtmsxHy/?format=pdf