Henri Bergson – Wikipédia, a enciclopédia livre

Henri Bergson Medalha Nobel
Henri Bergson
Henri Bergson na década de 1910
Nascimento 18 de outubro de 1859
Paris
Morte 4 de janeiro de 1941 (81 anos)
Paris
Sepultamento Cemetery of Garches
Nacionalidade francês
Cidadania França
Progenitores
  • Michał Bergson
Cônjuge Louise Neuberger
Irmão(ã)(s) Moina Mathers
Alma mater
Ocupação filósofo, professor, sociólogo, escritor
Prêmios Nobel de Literatura (1927)
Empregador(a) Collège de France, lycée David d'Angers
Tese Ensaio sobre os dados imediatos da consciência
Escola/tradição Espiritualismo francês
Movimento estético filosofia continental
Religião Judaísmo
Causa da morte complicações respiratórias
Assinatura

Henri Bergson (Paris, 18 de outubro de 1859 — Paris, 4 de janeiro de 1941) foi um filósofo e diplomata francês, laureado com o Nobel de Literatura de 1927.[1]

Conhecido principalmente por Ensaios sobre os dados imediatos da consciência, Matéria e Memória, A evolução criadora e As duas fontes da moral e da religião, sua obra é de grande atualidade e tem sido estudada em diferentes disciplinas - cinema, literatura, neuropsicologia, bioética, entre outras. Bergson procurou construir uma "metafísica positiva" e fazer da filosofia uma ciência baseada na intuição como um método, cujos resultados viriam da experiência e seriam tão rigorosos quanto as ciências baseadas na inteligência, como a matemática. Ao contrário de Platão e René Descartes, que usavam a geometria como modelo para fazer da metafísica uma ciência, Bergson adotou a biologia, a psicologia e a sociologia como fundamentos de seu pensamento filosófico.[2]

Biografia[editar | editar código-fonte]

Henri Bergson nasceu de família judia, filho de mãe inglesa e pai polaco. Viveu com os seus pais alguns anos em Londres, mas aos nove anos regressou a Paris. Ali fez os seus estudos no Liceu Fontanes onde ganha em primeiro lugar o prêmio de matemática no Concours Général resolvendo um problema de Pascal. Licenciando-se em Letras, em 1881 tornou-se professor, dando aulas em várias localidades da França, destacam-se desse momento as aulas no liceu Blaise Pascal de Clermont-Ferrand.

Em 1889 obteve o doutoramento pela Universidade de Paris com a tese Ensaios sobre os dados imediatos da consciência, e com uma tese secundária sobre Aristóteles. Bergson casou-se em 1892 com Louise Neuberger, uma prima do escritor francês Marcel Proust. Publica seu segundo livro em 1896 sob o título Matéria e Memória. Passa a lecionar na Escola Normal Superior de Paris dois anos depois. Em 1900, aos 40 anos, iniciou seus cursos a frente da cadeira de História da Filosofia Antiga no Collège de France.[3] Em 1907 publicou sua obra principal: A Evolução Criadora que une crítica da tradição filosófica especulativa, com intuição da duração e com as teorias evolucionistas de Herbert Spencer. Como diplomata, participa das discussões sobre a Primeira Guerra Mundial e exerce influência sobre a decisão dos Estados Unidos em intervir no conflito. Em 1914 Bergson torna-se membro da Academia Francesa, dois anos depois, publica Duração e Simultaneidade, obra que discute a comunicação de Einstein de 1905 sobre a teoria da relatividade restrita.

A partir de 1925 passou a sofrer de um reumatismo, que o deixou semi-paralisado, a ponto de impedi-lo de ir a Estocolmo para receber o Nobel de Literatura de 1927. Escreveu com grande dificuldade seu último livro, publicado em 1932: As Duas Fontes da Moral e da Religião. Nessa época, aproxima-se do cristianismo, mas não se converte por preferir não abandonar seus irmãos de raça que serão perseguidos pelo regime Nazista de Hitler. Faleceu em 1941, em 4 de janeiro, aos 81 anos, em Paris.[4]

Bergsonismo[editar | editar código-fonte]

Bergson é frequentemente situado na história da filosofia como espiritualista evolucionista. Os principais seguidores de seu pensamento são:

A ocupação da cadeira de filosofia no Collège de France após morte de Bergson foi feita por Édouard Le Roy e depois por Louis Lavelle que fundou com René Le Senne a coleção Philosophie de l'esprit em 1934.

Filosofia[editar | editar código-fonte]

A filosofia de Bergson é a princípio uma negação, isto é, uma crítica às formas de determinismo e “coisificação” do homem. Em outras palavras, a sua pesquisa filosófica é uma afirmação da liberdade humana frente as vertentes científicas e filosóficas que querem reduzir a dimensão espiritual do homem a leis previsíveis e manipuláveis, análogas as leis naturais, biológicas e, como imaginou Comte. Seu pensamento está fundamentado na afirmação da possibilidade do real ser compreendido pelo homem por meio da intuição da duração – conceitos que perpassam toda sua bibliografia. O próprio filósofo chegou a dizer que para compreender a sua filosofia é preciso partir da intuição da duração.

Conceitos[editar | editar código-fonte]

Duração, na obra de Bergson, é o correr do tempo uno e interpenetrado, isto é, os momentos temporais somados uns aos outros formando um todo indivisível e coeso. Oposto ao tempo físico ou sucessão divisível que é passível de ser calculado e analisado pela ciência, o tempo vivido é incompreensível para a inteligência lógica por ser qualitativo, enquanto o tempo físico é quantitativo.

Tempo e espaço não pertencem à mesma natureza, tanto que podemos afirmar que a consciência (duração interna) e o “tempo espacializado” se opõem. Esse último é criticado pelo filósofo como uma das expressões da vertente determinista das ciências e filosofias.

Tudo o que pertence à faculdade espacial, isto é, à variável t das leis físicas da mecânica clássica, é suscetível de ser repetida, decomposta e traduzida pela lógica científica, como, por exemplo, a medição do tempo por um relógio. Esse tempo físico, comumente confundido com o espaço, como fez Kant na Crítica da Razão Pura, não corresponde ao tempo real experimentado pelo espírito.

O tempo vivido (ou duração interna ou simplesmente consciência) é o passado vivo no presente e aberto ao futuro no espírito que compreende o real de modo imediato. É um tempo completamente indivisível por ser qualitativo e não quantitativo como o fator t.

A duração, não sendo compreendida por meio da inteligência técnica, também não pode, por consequência, ser entendida como sucessão linear de intervalos, pois ela é justamente o oposto disso, haja vista que não há como justapor ou analisar o tempo vivido qualitativo.

Ora, se não há como esmiuçar a duração percebida pelo espírito, também não há como prever os momentos temporais da duração interna, apenas a experiência física que se repete facilmente pode ser prevista e repetida, logo, a duração do tempo vivido e experimentado pelo espírito é imprevisível, uma novidade incessante e um fluir contínuo.

““La durée est le progrès continu du présent qui ronge l’avenir et qui gonfle en avançant”(EC, 498/5)”

TRADUÇÃO: "A duração é o progresso contínuo do presente que rói o futuro e aumenta avançando."

— Citação de Frédéric Worms em Le vocabulaire de Henri Bergson, Ellipses, Paris, 2000[5]

Intuição significa para Bergson apreensão imediata da realidade por coincidência com o objeto. Em outras palavras, é a realidade sentida e compreendida absolutamente de modo direto, sem utilizar as ferramentas lógicas do entendimento: a análise e a tradução.

Diferencia-se da inteligência que, apropriando-se do mundo através de ferramentas, calcula e prevê intervalos do mesmo plano espaço-temporal; a intuição, ao contrário, penetra no interior da vida coincidindo com o real imediatamente. Dizemos, portanto, que o real passou a ser conhecido pela metafísica como, ao modo de Descartes, numa certeza imanente ao próprio ser do sujeito cognoscente.

A intuição é uma forma de conhecimento que penetra no interior do objeto de modo imediato, isto é, sem o ato de analisar e traduzir. A análise é o recorte da realidade, mediação entre sujeito e objeto. A tradução é a composição de símbolos linguísticos ou numéricos que, analogamente a primeira, também servem de mediadores. Ambas são meios falhos e artificiais de acesso a realidade. Somente a intuição pode garantir uma coincidência imediata com o real sem o uso de símbolos nem da repartições analíticas.

A intuição pode ser entendida, portanto, como uma experiência metafísica.

Intuicionismo[editar | editar código-fonte]

Bergson foi o expoente da linha de filosofia intuicionista, assim chamada porque afirma constituir o verdadeiro conhecimento não nos conceitos abstratos, do intelecto racionalmente, mas na apreensão imediata, na intuição, como é evidenciado pela experiência interior.

Segundo o filósofo, há dois caminhos para conhecer o objeto, duas formas de conhecimento, diversas e de valores desiguais: mediante o conceito e mediante a intuição.

A forma mediante o conceito é o caminho dos conceitos, dos juízos, silogismos, análise e síntese, dedução e indução; a segunda forma é o da intuição imediata que nos proporciona o conhecimento intrínseco, concreto, absoluto.[6]

Bergson conceitua a intuição como a faculdade suprema do impulso vital (élan vital) e faculdade cognoscitiva do filósofo.[6] Segundo o filósofo, "hoje, só raramente e com grande esforço, podemos chegar à intuição; no entanto a humanidade chegará um dia a desenvolver a intuição de tal modo que será a faculdade ordinária para conhecer as coisas. Então, desaparecerão todas as escolas filosóficas e haverá uma só filosofia verdadeira conhecedora da verdade e do ser absoluto."

Bergson foi, também, um dos primeiros a fazer referência ao inconsciente.

Obras principais[editar | editar código-fonte]

Inscrição em homenagem a Henri Bergson no Panteão de Paris.

Comentadores[editar | editar código-fonte]

  • Le mobilisme moderne (1908) de Alphonse Chide (1868-1952)
  • Le bergsonisme ou une philosophie de la mobilité (1912) de Julien Benda (1867-1956)
  • Devoir et durée (1912) de Joseph Wilbois (1874-1952)
  • Sur le succès du bergsonisme (1914) de Julien Benda (1867-1956)
  • Note sur M. Bergson et la philosophie bergsonienne. Note conjointe sur M. Descartes et la philosophie cartésienne (1914) de Charles Péguy (1873-1914)
  • La pensée intuitive (1929) de Édouard Le Roy (1870-1954)
  • La fin d'une parade philosophique, le bergsonisme (1929) de Georges Politzer (1903-1942)
  • Henri Bergson (1931) de Vladimir Jankélévitch (1903-1985)
  • Le temps vécu (1933) de Eugène Minkowski (1885-1972)
  • Le temps musical (1945) de Gisèle Brelet (1915-1973)
  • Personnalité, création, combat de Vaclav Cerny
  • La pensée interrogative (1954) de Jeanne Delhomme (1911-1985)
  • Presença e Campo Transcendental: Consciência e Negatividade da Filosofia de Henri Bergson (1965) de Bento Prado Júnior, publicado somente em 1988
  • Le Bergsonisme (1966) de Gilles Deleuze (1925-1995)
  • La pensée et le réel. Critique de l'ontologie (1967) de Jeanne Delhomme (1911-1985)
  • Bergson: Intuição e Discurso Filosófico (1994) de Franklin Leopoldo e Silva
  • Bergson ou le deux sens de la vie (2004) de Frédéric Worms (1964), publicado em português com o título Bergson ou os Dois Sentidos da Vida (2010)
  • Bergson: O método Intuitivo: uma abordagem positiva do Espírito (2008) de Astrid Sayegh
  • "O ator risível: procedimentos para as cenas cômicas" (2010) Fernando Lira Ximenes
  • Bergson: A Consciência Criadora: Metafísica da Ciência (2010) de Astrid Sayegh
  • Derrida-Bergson. Sur l'immédiateté, Hermann, Paris, coll. "Hermann Philosophie", de Pierre-Alexandre Fradet ISBN 9782705688318 (2014)

Ver também[editar | editar código-fonte]

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Referências

  1. «The Nobel Prize in Literature 1927» (em inglês). Nobelprize.org. Consultado em 8 de março de 2006 
  2. Henri Gouhier, Bergson et le Christ des Évangiles, Paris, Vrin, 1999, p. 34.
  3. Vieillard-Baron, Jean-Louis(1944). "Bergson et le bergsonisme", Paris, Armand Colin, 1999.
  4. Frédéric Worms avec Philippe Soulez, Bergson : biographie, Paris, Presses universitaires de France, « Quadrige », 2002.
  5. a b A duração é o progresso contínuo do passado que rói o futuro e que incha avançando.
  6. a b PADOVANI e CATAGNOLA. História da filosofia. [S.l.: s.n.] pp. 459–60 

Bibliografia[editar | editar código-fonte]

  • Bergson, Henri. Correspondências, obras e outros escristos, São Paulo, Abril Cultural, 1974
  • Bianco, Giuseppe. Après Bergson. Portrait de groupe avec philosophe. Paris, PUF, 2015.
  • Deleuze, Gilles. Le Bergsonisme, Paris, Puf, 2004
  • Jankélévitch, Vladimir. Henri Bergson, Paris, Puf, 2008
  • Prado Júnior, Bento. Presença e Campo Transcendental: Consciência e Negatividade na Filosofia de Bergson, São Paulo, EDUSP, 1988
  • Sayegh, Astrid. Bergson: A Consciência Criadora: Metafísica da Ciência, São Paulo, Humanitas, 2010
  • Sayegh, Astrid. Bergson: O método Intuitivo: uma abordagem positiva do Espírito, São Paulo, Humanitas, 2008
  • Vieillard-Baron, Jean-Louis. Bergson et le bergsonisme, Paris, Armand Colin, 1999
  • Worms, Frédéric. Bergson ou os Dois Sentidos da Vida, São Paulo, Editora Unifesp, 2010
  • Worms, Frédéric. Le vocabulaire de Bergson, Paris, Ellipses, 2000
  • Worms, Frédéric; Soulez, Philippe. Bergson : biographie, Paris, Puf, « Quadrige », 2002
  • Silva, Franklin Leopoldo. Bergson : Intuição e Discurso Filosófico, São Paulo, Edições Loyola, 1994
  • Sokal, Alan; Bricmont, Jean. "Imposturas Intelectuais". Rio de Janeiro: Record, 2006.

Ligações externas[editar | editar código-fonte]


Precedido por
Grazia Deledda
Nobel de Literatura
1927
Sucedido por
Sigrid Undset